Uma olhadela no traseiro da Lua

As pessoas ainda se apegam a muitos conceitos de antigos gregos. O lado escuro da Lua, por exemplo. Como se a Lua só fosse iluminada apenas de um lado. A verdade é que sua velocidade de rotação é equivalente ao período orbital em relação à Terra. Ela tem os dois lados iluminados, mas nós sempre vemos o outro lado.

Há alguns dias, o NOAA veiculou imagens do satélite Deep Space Climate Observatory (DSCOVR). De suas imagens resultou numa linda animação, com a Lua passando pelo Planeta Azul.

O DSCOVR é um satélite que não é da NASA, mas do NOAA, a Administração Nacional de Oceanos e Atmosfera. Se é artificial, voa e estuda planetas, cometas, estrelas mandando tudo pro vinagre, é atribuição da NASA, a Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço. Se é sobre clima e oceanos, é com o pessoal do NOAA. E para observar oceanos e o clima, nada melhor que satélites.

O DSCOVR foi lançado pela Falcon 9, da SpaceX, em 9 de fevereiro de 2015, já que eles estavam cobrando um precinho mais camarada. Sim, porque mandar uns pedaços de metal, gente e qualquer bugiganga lá pra cima não sai nada muito barato. Inicialmente, o DSCOVR – antes chamado de "Triana" – era para ser um satélite da NASA, proposto em 1998 pelo então vice-presidente Al Gore para o propósito de observação da Terra. Por causa disso, alguns engraçadinhos chamaram o bichão de Goresat. Só faltou ter canal por assinatura próprio.

O DSCOVR está Ponto de Lagrange L1. Sabe o que isso significa? Bem, já começa que quem calculou este lugar foi o matemático Joseph-Louis de Lagrange, em 1772; mas só os pontos L2 e L3. O primeiro ponto foi calculado por um senhor que entendia alguma coisinha de contas. Seu nome era Leonhard Euler, e fez esta descoberta 5 anos antes de Lagrange. E você aí tentando entender a fatura do seu cartão de crédito, usando calculadora, Excel whatever.

Lagrange estava tentando resolver o Problema dos Três Corpos. Este problema, que data de 1687 e foi mencionado no Principia, o livro de Isaac Newton, leva em conta a ação de 3 corpos no Espaço, em que se deveria obter uma região com órbita estável. O problema é que cada um desses corpos têm massas, tamanhos e movimentos diferentes em termos de trajetória e velocidade. Sim, é uma dor de cabeça, já que qualquer corpo que possui massa exerce força gravitacional. Pense em você, seu teclado e o mouse. Cada um exerce força gravitacional nos outros dois (e no que estiver ao redor). Mas a Gravidade é uma força muito fraca, além de ser uma teoria, e como sabemos, teorias são coisas que não foram provadas, de acordo com nossos amigos fundamentalistas. Por causa disso, você não sente a força do mouse nem do teclado, nem os citados. A Gravidade é tão fraca, que um planetão do tamanho da Terra puxa a sua cadeira pra baixo, mas você pode levantá-la com uma das mãos.

Mas temos o Sol, a Lua e a Terra, 3 corpos de tamanho considerável, cujas forças gravitacionais de suas massas cancelam a aceleração centrípeta. Como encontrar um lugar estável ali? Bem, Euler (e depois Lagrange) sentou a bunda e foi calcular isso tudo. São cinco pontos.

Lagrange publicou o seu "Essai sur le problème des trois corps" (Ensaio sobre o problema dos três corpos). No primeiro capítulo, ele considerou o problema dos três corpos, e no segundo capítulo, Lagrange demonstrou duas soluções para a constante-padrão especial (a colinear e a equilátera) para qualquer uma das três massas, com órbitas circulares.

O DSCOVR fica no ponto L1, a cerca de 1,5 milhão km da Terra, lembrando que a Lua fica a cerca de 400 mil km e a ISS fica a ridículos 350 km da Terra, menos que a distância entre Rio e São Paulo. L1 é um lugar maravilindo para estudar o Vento Solar. L2 fica à mesma distância da Terra, mas para o "outro lado". Nisso, nosso satélite amiguinho está coletando imagens da Terra a cada duas horas. E as imagens trazidas, convertidas em animação, são esta lindeza aqui:

Fantasticamente lindo. A câmera que fotografou? Ela tem o nome de the Earth Polychromatic Imaging Camera ou Câmera de Imageamento Policromático da Terra, mas faz mais jus ao seu acrônimo: EPIC. Realmente, essa imagem é épica! Ela é gerada através da combinação de três imagens separadas para criar uma imagem com qualidade excelente, tirando uma série de 10 imagens usando diferentes filtros de banda estreita, do ultravioleta ao infravermelho próximo, para produzir uma miríade de fotos que chegam até a Terra e são estudadas a fundo.

Saber mais é entender mais. É expandir horizontes. É não só entendermos o nosso lugar no mundo como tentar fazer de tudo para que este lugar seja melhor. Para tanto, é preciso olhar para esse mundo nos menores detalhes. Mas, claro, vão alegar das criancinhas passando fome na África. Não importa, as imagens continuam sendo maravilhosas!


Fonte: Bad Astronomy

7 comentários em “Uma olhadela no traseiro da Lua

  1. Antes que algum conspiracionista venha aparecer e falar “É FAKE! FOI FEITA EM FUNDO VERDE, DÁ ATÉ PRA VER A BORDA VERDE NA LUA!!!” o efeito acontece porque a Lua e a Terra se movimentam entre uma foto e outra, e cada foto é feita com um filtro de cor diferente (como explicado pelo artigo). E na hora da sobreposição ficam um pouquinho desalinhadas.

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  2. Pela imagem, era para essa passagem ter gerado um eclipse. Mas essas fotos foram feitas dia 16 de Julho e o último eclipse foi em Março (o próximo é em Setembro). Acho que to interpretando algo errado…

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    1. Isso ocorre devido a inclinação da órbita Lunar em mais de 5 graus em relação à órbita da Terra. Então mesmo com a Lua passando “em frente” ao Sol, nem sempre ocorrerá um eclipse a cada Lua nova (quando as imagens foram capturadas). Para que haja o eclipse é necessário o alinhamento correto entre Sol, Terra e Lua.

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      1. Sim, imaginei que fosse questão de ângulo, mas parece que passou taaão certinho… Não sabia que 5 graus já fariam tanta diferença, valeu ae!

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        1. Não apenas a inclinação, mas a distância e a órbita influenciam também Se a órbita da Lua fosse mais circular, mais próxima da Terra e não tivesse essa inclinação, teríamos um eclipse Solar por mês!

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