Equívocos comuns sobre castelos medievais

Quando você pensa em um castelo medieval, o que vem à sua mente? Torres imponentes, cavaleiros com armaduras brilhantes, salões escuros iluminados por tochas e espadas cruzadas nas paredes? Essa imagem é irresistível… e mentirosa

A verdade sobre os castelos medievais é muito mais diversa, surpreendente e, em muitos casos, bem diferente do que o cinema, os livros e as séries nos fizeram acreditar. Eu sou André e farei o favor de acabar com seus sonhos de infância mostrando que tudo o que você acha que sabe sobre castelos é mentira.

Antes de mais nada, precisamos definir o que é um castelo. Um castelo é definido como uma edificação fortificada, predominantemente erguida durante a Idade Média na Europa, que integrava funções residenciais, defensivas e administrativas. Estruturalmente, caracteriza-se por elementos como muralhas robustas e torres de vigia. Alguns (nem todos) possuíam fossos, pontes levadiças e portões reforçados, projetados para resistir a ataques militares e proteger seus ocupantes. Vamos examinar os erros que as pessoas cometem, principalmente alguns perfis de “história” nas redes sociais..

Escadas em espiral sempre giravam no sentido horário

Muitos acreditam que as escadas em espiral dos castelos sempre giravam no sentido horário para beneficiar os defensores destros, dificultando o ataque de quem subia. Embora isso seja parcialmente verdade, cerca de 30% das escadas giravam no sentido contrário. Isso mostra que não havia uma regra rígida sobre isso, e outros fatores influenciavam o projeto, como o terreno, a arquitetura geral e até a preferência do construtor.

Além disso, essa ideia assume que o combate acontecia frequentemente nas escadas, o que era improvável. Se os inimigos já estavam dentro do castelo a ponto de lutar nas escadas, a defesa já havia falhado em outras partes mais importantes, como os portões ou muralhas. Escadas apertadas e em espiral não são bons locais para se lutar — limitam os movimentos, e não há muito espaço para usar espadas ou escudos com eficiência.

Curiosamente, estudos arqueológicos e exemplos como o da Torre Clifford, em York, escadas espirais que giram tanto no sentido horário quanto no sentido anti-horário. Isso pode ter favorecido senhores canhotos, ou simplesmente refletir outras necessidades arquitetônicas.

A variedade encontrada nos castelos mostra que nem sempre a defesa era pensada com essa lógica de “vantagem para o destro”. É, portanto, um mito.


Castelos eram sempre frios, escuros e sem graça

Muita gente imagina os castelos como lugares sombrios, com paredes de pedra crua, pouca luz e zero decoração. Isso vem principalmente dos filmes, que optam por esse visual para criar uma atmosfera mais “medieval”. Mas a realidade era bem diferente, principalmente nos castelos de nobres e reis, onde havia muito investimento em beleza e conforto.

Por dentro, castelos podiam ter paredes rebocadas, pintadas com cores vivas, decoradas com murais religiosos e cenas históricas. Um exemplo são as paredes internas do Castelo de Cardiff, onde se usava pintura simulando tijolos decorativos por cima do reboco branco. Isso dava um ar sofisticado ao ambiente, além de demonstrar riqueza.

A decoração não era só estética — ela também tinha função política. Cores e pinturas mostravam poder, status e devoção religiosa. Ter artistas trabalhando no interior do castelo, além de acesso a pigmentos caros, era um símbolo de prestígio. Esses detalhes, infelizmente, quase nunca são mostrados nas representações modernas.


Todos os castelos eram brancos por fora

É verdade que muitos castelos eram rebocados e caiados por fora, tanto para proteger a pedra contra a chuva quanto para deixá-los visualmente imponentes. Porém, nem todos seguiam esse padrão. Alguns castelos foram feitos para ter as pedras expostas, especialmente quando essas pedras eram bem trabalhadas e formavam padrões decorativos.

O Castelo de Caernarfon, no País de Gales, é um excelente exemplo. Suas paredes apresentam faixas horizontais de pedras claras e escuras, imitando o estilo das muralhas de Constantinopla. Isso mostra que a escolha pelo “pedra aparente” também podia ser estética e simbólica, associando o castelo à grandiosidade do Império Bizantino.

Essas pedras chamadas “dressed stone” (ou “pedras talhadas”) eram mais caras e difíceis de produzir. Exibi-las era um sinal claro de riqueza e poder. Logo, nem todo castelo era rebocado — alguns, como Caernarfon, foram projetados para impressionar justamente com a pedra à mostra.


As ameias eram sempre baixinhas, como nos filmes

Em filmes e séries, é comum ver as muralhas dos castelos com ameias baixinhas, aquelas muretas com “dentes” chamadas de crenelações. Elas quase sempre aparecem na altura da cintura dos personagens, o que facilitaria muito tomar uma flechada. Na realidade, as ameias reais tinham altura suficiente para esconder completamente uma pessoa atrás delas.

Essas estruturas são compostas pelos merlões (as partes sólidas) e as crenelas (os vãos entre eles). Em castelos históricos como o de Warwick, os merlões alcançam a altura da cabeça, permitindo que os arqueiros se escondam completamente e ataquem com segurança. Isso fazia parte de um projeto funcional de defesa, e não apenas decorativo.


Servos viviam em condições miseráveis

A ideia de que todos os servos viviam em pobreza extrema, sendo maltratados e explorados, é uma visão simplificada e nem sempre verdadeira. Em muitos castelos, especialmente os maiores, o trabalho como servo podia oferecer boas condições: moradia, alimentação e até aposentadoria. Em troca, exigia-se lealdade e dedicação.

O Castelo de Warwick, por exemplo, tratava seus empregados com respeito. Havia dormitórios próprios para os criados, salários justos e, em alguns casos, a possibilidade de continuar morando no castelo após a velhice, mesmo sem mais trabalhar. Isso mostra que havia relações mais humanas e estáveis do que normalmente se imagina.

Claro que existiram abusos, e nem todos os senhores eram justos. Mas também existiram castelos em que a estrutura feudal funcionava como uma rede de apoio e proteção, onde o serviço era recompensado com segurança e estabilidade — algo raro até mesmo hoje.


Capelas nos castelos sempre tinham bancos

Ver bancos em capelas medievais dentro de castelos pode parecer normal, mas essa é outra confusão. Durante a Idade Média, os fiéis ficavam em pé durante as missas e cerimônias religiosas. Os bancos, como os conhecemos hoje, só se popularizaram séculos depois, principalmente a partir do século XVII.

Isso significa que muitas capelas anexas a castelos que vemos hoje — com bancos de madeira enfileirados — foram reformadas em épocas mais recentes. Algumas até reutilizaram elementos antigos, como vitrais ou altares, mas o mobiliário moderno foi acrescentado posteriormente. Um exemplo é a capela do Castelo de Warwick, que mistura elementos medievais com reformas posteriores.

Essa mudança na disposição dos espaços religiosos também está ligada à transformação da liturgia e à influência da Reforma e do estilo anglicano, que colocaram maior ênfase na pregação e no conforto do fiel sentado. Na Idade Média, a ênfase estava mais no ritual coletivo — e isso não envolvia sentar-se. Era até impensável você se sentar perante a presença de Deus naquele ambiente sagrado, segundo se achava na época.


Todos os castelos eram enormes e imponentes

Quando pensamos em castelos, geralmente imaginamos construções gigantescas, com dezenas de torres, muralhas infinitas e grandes salões. Mas isso é uma ilusão criada principalmente por filmes e séries. Na realidade, a maioria dos castelos medievais era relativamente pequena e simples.

Muitos castelos consistiam apenas em uma torre principal (o “keep”), um pátio murado e algumas construções auxiliares como estábulos e oficinas. Exemplo disso é a Torre de Belém, em Portugal, que possui apenas uma torre fortificada e poucos aposentos. Era o suficiente para defender a propriedade local e abrigar uma pequena guarnição.

Embora seja mais uma fortificação do que um castelo tradicional, é um exemplo icônico de uma estrutura defensiva isolada, composta essencialmente por uma única torre sem outras construções anexas significativas. Assim, se você voltar lá pra cima e ler a definição de castelo, poderá ver que a Torre de Belém é um castelo, sim.


As paredes internas eram sempre de pedra crua

É comum imaginar o interior dos castelos com paredes de pedra bruta à vista, frias e úmidas. Mas isso também é um mito. Na maioria dos casos, as paredes internas eram rebocadas e pintadas, não apenas por estética, mas também para isolamento térmico e proteção da pedra.

Havia dois tipos principais de paredes visíveis: aquelas com reboco pintado (às vezes com padrões que imitavam tijolos ou decoravam com murais) e aquelas feitas com pedras bem talhadas (chamadas “dressed stone”), que dispensavam acabamento. Um exemplo impressionante disso está no Castelo de Cardiff, já mencionado.


Móveis medievais eram sempre escuros e simples

Muitos filmes mostram os móveis dos castelos como pesados, escuros e sem nenhum enfeite. Mas isso é baseado na aparência atual de móveis antigos, cujas tintas desapareceram com o tempo. Na Idade Média, os móveis nobres eram pintados com cores vivas, muitas vezes com detalhes dourados ou brasões da família.

Exemplos disso podem ser vistos no Castelo de Dover, onde foram preservadas ou recriadas cadeiras e camas com cores fortes, como vermelho, verde e dourado. Isso reflete o gosto medieval por ambientes coloridos — muito diferente do estilo mais sóbrio do século XIX, que influenciou o design que conhecemos hoje.

Pintar móveis era uma prática comum porque trazia prestígio, requeria tintas caras e, em alguns casos, trabalho de artistas especializados. Portanto, aquele trono marrom escuro e sem graça que vemos em tantos filmes está longe de representar a realidade dos nobres da Idade Média.


Os castelos eram mais que uma figura esmagadora por suas defesas e imponência, mas o luxo e poder que traduziam sem seu interior. O rei, nobre ou senhor feudal tinha as mesmas necessidades sociais de hoje e precisavam, não apenas dizer que eram ricos e poderosos, mas efetivamente mostrar essa riqueza e poder, porque alguém bem rico podia ter um exército à sua disposição, e isso já dava um impacto psicológico. O jogo de aparências sempre existiu. Ontem, com castelos, hoje, com algum carro esporte, ou mesmo um celular comprado num camelô por vias nada duvidosas, porque ninguém tem dúvida.

3 comentários em “Equívocos comuns sobre castelos medievais

  1. Eu entendo que os castelos eram como as prefeituras das cidades atualmente. Havia um monte, com seus respectivos nobres, e havia um poder central que regia tudo isso. Eu não entendia por que catzo tinha tanto rei nos contos de Grimm até me dar conta disso.

    Curtir

    1. Porque o conceito de reino era diferente. Haja vista que hoje temos muitos reinos que são minúsculoos, como Mônaco e Leichenstein. Estavam mais para príncipes, mas Rei é mais chamativo

      Curtir

Deixe um comentário, mas lembre-se que ele precisa ser aprovado para aparecer.