A Internet trouxe muita coisa legal, mas também trouxe outra praga (não, não são os filósofos. Estes já existiam antes da Internet ser moda). São as tirinhas, que as pessoas usam como se fosse a verdade definitiva, num arroubo intelectual como se fossem trazidas por Moisés. E quando colocam estas tirinhas de desenhos feitos por quem não sbe desenhar, parece que ganha maior credibilidade. Algo como "O cara desenha mal pra cacete, logo, saca das coisas.

Mas a realidade é um tantim diferente.

Pessoal está compartilhando esta tirinha do Cyanide & Happiness:

Se você não entende inglês, o Zé de (camisa?) cinza diz que ama a Ciência por causa de um fato (unhas e cabelos são feitos do mesmo material). O babacão de verde tira onda (meio como o pessoal da Filosofia que cai de para-quedas aqui, tentando convencer a si mesmos que Filosofia serve pra algo) dizendo que o outro só gosta da Ciência por causa de alguns fatos maneiros, mas que não entendia a Ciência. Ele apenas se admirava pelas partes tidas como "chatas" mas dizia que amava a Ciência da mesma forma que pessoas que passavam estudando as partes tediosas. Por fim, o energúmeno diz que o Zé de cinza não ama a ciência, apenas olha pra bunda dela quando passa pela mesma.

Isso é de uma estupidez cavalar, como o que se pode esperar de alguém que cria tirinhas mal desenhadas, pagando de intelectual? Quais as pesquisas científicas este idiota fez? Afinal, quem realmente ama a ciência? O Escocês?

Ciência não é apenas saber que unhas e cabelos são feitos do mesmo material. Ciência é a fascinação de aprender algo novo, algo inusitado, algo que pode dar novas perspectivas, apresentando ao mundo o próprio mundo. Para um cientista, não existem partes chatas e/ou desinteressantes. O verdadeiro cientista é aquele que aprende todos os dias e divulga o que aprendeu. O cientista é aquele que pega um bicho-folha e vê ali bilhões de anos de Evolução biológica e diz: ‘aqui eu tenho um bicho que tem um formato de folha. Isso o ajudou, isso é fantástico." Não preciso ver todos os clados, analisar cada gene do animal. Não preciso saber todos os ancestrais comuns do animal em questão e a planta de onde a folha se originou.

Ciência é entender as possibilidades, assim como as bases do que torna as coisas possíveis. Ciência é produzir conhecimento novo, sim, claro. Mas não podemos dizer que uma percentagem ridícula de genes nos diferenciam de chimpanzés. É saber que Júpiter abrigaria dentro de si todos os demais planetas com folga. É ver que o Sol exerce uma força gravitacional até depois da Nuvem de Oort. È saber que o mesmo princípio de vinagre bicarbonato dentro de um potinho de filme fotográfico (pergunte aos seus pais o que é isso), fez o Homem ir à Lua.

As pessoas pensam no conceito de amor e não entendem, mesmo falando toda hora "Mô, te amo!". Imagino você amar Eça de Queiroz porque leu um livro não é amor, é olhar a bunda do lusitano. Amar é sempre um destaque de algo. Você ama alguém, não porque esta pessoa tem defeitos, mas pelas qualidades. Eu não amo química porque eu entendo que ela pode matar 99,99999% de vocês; Química é a Austrália das ciências (você leu primeiro aqui). Eu amo química porque eu sei coisas muito legais que explicam o mundo. Tem algumas partes chatas, mas meu cérebro as ignora, achando que são ossos do ofício.

Nem todo mundo precisa saber as minúcias. Acho que pelo contrário. Indo de fato em fato, se a pessoa tomar gosto pela coisa, procurará aprender mais. Encontrará as partes chatas e passará por cima delas, assim como sua mulher feia, desdentada e com voz de taquara rachada lhe é linda e maravilhosa. Não por causa dos defeitos. Simplesmente porque você a ama, independente da bunda dela (que deve estar caída, também).

Então, por gentileza, antes de filosofar com as tirinhas vagabundas, coloquem-nas no lugar no qual elas realmente pertencem: no lugar que tanto admiram mas pouco amam.