Cientistas pesquisam bactérias que degradam compostos organo-fosforados

Na Química Industrial, um dos mais importantes compostos é, com certeza, o ácido sulfúrico. Sua produção e utilização, mediante seus múltiplos usos, é um dos principais indicativos do grau de industrialização de um país. Assim como o H2SO4, os vários tipos de ácidos derivados do fósforo são muito importantes e um dos principais é o ácido ortofosfórico (H3PO4). Entretanto, ele não é o único. O ácido fosforoso (H3PO3) possui múltiplas utilizações. Normalmente, ele apresenta tautomeria, isto é, ele permanece em equilíbrio químico dinâmico, mudando sua configuração molecular, conforme é apresentado abaixo.

A diferença está que os hidrogênios só sairão para a solução sob a forma de hidrogênio ionizável se ele estiver ligado ao oxigênio, o que acarretará no grau de acidez da solução. Como estes hidrogênios são reativos, eles podem ser substituídos por radicais orgânicos (não, não é um tomate comunista, apesar de ser vermelhinho). Estes compostos são chamados ácidos fosfônicos – também chamados compostos "organo-fosforados" – e são muito empregados na indústria. Só que eles não são bonzinhos como podem imaginar.

Os organo-fosforados são compostos com uma imensa gama de aplicações. Desde herbicidas até armas químicas, passando por detergentes, reagentes gerais em pregados em outras sínteses etc, estes compostos ajudaram em nosso desenvolvimento tecnológico, enquanto envenena rios, plantas e diretamente as pessoas, dependendo do uso, em que a Química mostra seu lado sardônico pois dentre esta gama não só temos venenos como temos remédios também (sugiro leitura deste artigo).

Infelizmente, poluição por compostos organo-fosforados não é algo que deixe alguém feliz. Em mamíferos, seus efeitos variam do lacrimejamento até diarreia. Tremores e distúrbios cardiorrespiratórios também estão presentes, além de atacar o sistema nervoso central, podendo levá-lo para o Céu/Paraíso/Valhalla/Tumba. Escolha o mito ou o eufemismo, o resultado é que a pessoa passará desta pra melhor da maneira pior possível. Dessa forma, muitos pesquisadores estudam como atacar o problema de frente e encontrar métodos que possam minimizar a ação destes poluentes.

O problema com os organo-fosforados está em sua estabilidade química, isto é, ele não "azeda" como dizemos na indústria. Esse "azedar" significa que os compostos não sofrerem deterioração espontânea. Por exemplo. Se eu tenho peróxido de hidrogênio (água oxigenada, H2O2) e o deixo em presença de luz, o composto acaba se desnaturando, perante a seguinte reação: 2 H2O2 –> 2 H2O + O2. Ou seja, naturalmente, o peróxido de hidrogênio é convertido em água comum, liberando oxigênio para a atmosfera. Não é à toa que os frascos contendo água oxigenada são escuros (ou, pelo menos, deveriam ser).

No caso dos organo-fosforados, eles não são convertidos em outras substâncias naturalmente, como o cloreto de sódio (o famoso sal de cozinha). Deixe o sal em cima da mesa e ele ainda será sal por muitos anos, décadas, séculos e assim por diante. Nisso, estima-se que mais de 20 MIL toneladas de ácidos fosfônicos são lançados anualmente no meio ambiente para o lado de cá de Greenwich. Muitos deles acabam como contaminantes em águas subterrâneas, levando a preocupação com seu impacto na saúde humana e da vida aquática.

O dr. David Zechel é professor do Departamento de Química da Queen’s University, no Canadá. Juntamente com seus colaboradores, o dr. Zechel procura descobrir um modo de conter a poluição e,  agora, parece que estão no caminho certo. Eles estudam a utilização de matrizes biológicas que possam quebrar as moléculas dos compostos safadinhos e potencialmente perigosos. Os melhores candidatos são bactérias.

O fósforo é componente importantíssimo na construção das estruturas do DNA e do RNA. Ele é empregado sob a forma de ATP para armazenar energia e isso é vital para as células. A energia não circula entre as células ligando as mesmas na tomada, e sim por via química. As bactérias empregadas pelo dr. Zechel atacam os compostos organo-fosforados visando unicamente o fósforo para manter sua base bioquímica. Ela não está lhe fazendo nenhum favor e nem é boazinha. Essas bactérias usam enzimas – as chamadas liases carbono-fósforo – para a degradação das substâncias poluentes, retirando o seu amado fósforo e, para nós, substâncias com o menor impacto ambiental possível. A pesquisa foi publicada no periódico Proceedings of the National Academy of Sciences.

É difícil ficarmos sem usar compostos organo-fosforados e nem é viável parar totalmente a produção deles atualmente. Há pesquisas que visam substituí-los, mas dadas as suas propriedades, bem possível que eles ainda estejam circulando por aí por muitos anos. Pelo menos, temos um modo de combater os resíduos, talvez sem resolver inteiramente o problema, mas o máximo que se consiga reduzir seu impacto ambiental é um excelente negócio.


Fonte: Press Release da Queen’s University

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