Aviões tiroteios e como você é burro e acredita nas primeiras impressões

Algumas coisas parecem óbvias demais, mas de tão óbvias são descartadas. A análise de dados brutos leva a pensamentos toscos e erros grosseiros, mesmo achando que faz muito sentido. Nem sempre faz. Por exemplo, a piada contumaz é que se você se candidata a governador no Rio de Janeiro, seu destino será ir pra cadeia. Bem, o raciocínio é divertido, mas saindo do exagero, é extremamente burro. mesmo porque, se foi preso foi porque cometeu crimes. Que bom que quem comete crimes vai pra cadeia, não?

De novo, a análise grosseira leva achar que se você prende criminosos, você está errado.

Por exemplo, você está acostumado a achar que a cidade do Rio de Janeiro é praticamente a Síria num péssimo dia. Você coloca os pés para fora de casa e é bala perdida pra todo lado, tráfico, 5 bandidos numa única moto, a sucursal do Inferno.

É essa a percepção, já que a todo momento saem nos jornais, TV e rádio cada assalto e morte violenta que acontece no Rio. Você já ouviu falar de um lugar chamado São João do Jaguaribe? Provavelmente, não. Ele fica no Ceará e registrou o primeiro lugar no ranking de assassinatos por 100 mil habitantes: 224. Em quantos jornais saiu isso? Fora a reportagem sobre violência que a Folha postou, em lugar nenhum, imagino.

De uma relação de 30 cidades, Rio de Janeiro não estava em nenhum lugar.

Em 2018, em uma relação de 100 cidades, o município do Rio de Janeiro não estava em nenhum lugar. Queimados, uma cidade da Baixada Fluminense, estava em primeiro, mas em 4 anos perdeu a pole position da vergonha. Mas continuam noticiando que a cidade do Rio é violenta. Por que? Percepção errônea.

Vou parar um instante e voltar no tempo.

Durante a Segunda Guerra Mundial, os exércitos de todos os lados estavam preocupados com perdas. Não de soldados, já que esses manés são conseguidos facilmente. O problema eram os recursos materiais, como tanques, navios e aviões. No caso dos aliados, eles precisavam saber como impedir que aviões fossem derrubados. A solução imediatista é: blinda aquela bagaça. Simples, não?

Para todo problema complexo existe sempre uma solução simples, elegante e completamente errada.

– H. L. Mencken

Legal, beleza. Há diversos problemas aí. Primeiro, custo. Tem que levar mais chapas de metal para blindagem, e isso não é de graça. Em segundo lugar, logística: quanto mais blindagem, mais peso. Mais peso é necessário redesenhar o avião e gastar mais material e gastar mais com combustível. Não pode. A solução de meio termo é, portanto, blindar as partes mais importantes. Mas quais?

Chamaram um camarada chamado Abraham Wald, matemático que fazia parte do Grupo de Pesquisa Estatística, um programa secreto que direcionou os esforços dos melhores matemáticos da época para a Guerra de forma a darem uma ajudinha, já que não eram muito bons em matar gente; de repente, trabalhavam evitando que gente não morresse, mas gente do lado certo.

Wald analisou dados sobre os aviões q voltavam de missões e estudou os padrões de perfuração por tiros que o Eixo mandava pra cima deles. Ele tabulou as informações, o que gerou um gráfico assim, mostrando onde os aviões que voltavam tinham sido mais alvejados. O gráfico foi algo como isso aqui:

O gráfico era claro. Claríssimo! As partes mais atingidas era a fuselagem, mais especificamente as asas e o meio do avião. Claro que era ali que tinha que proteger mais. Todos os comandantes foram taxativos com isso.

GOTO MENCKEN

Wald disse que não. A abordagem estava errada. Mas os dados apontavam, teriam dito os presentes. O problema não era o que o gráfico mostrava, era o que não mostrava, e o que ele não mostrava eram aviões que tinham sido atingidos na cabine e nos motores. Por quê? Por um motivo simples: os dados eram coletados com os aviões que voltavam do combate, não os que não voltavam. E havia muitos motivos pros aviões não voltarem: ou tinham sido abduzidos por ETs, ou Thanos os vaporizou, alguns caíram no Triângulo das Bermudas, resolveram dar uma chance à paz e foram pro Tibet montar um templo ou, o que seria a única resposta minimamente coerente, tinha sido abatidos.

Ou seja, se der tiro nos motores, aquela bagaça explode e o avião cai. Expondo assim é óbvio, mas não quando se baseiam nos dados soltos, sem análise criteriosa. Tomar tiro nas asas não impede o avião de voltar à base. Acertar a cabine, matando todo mundo lá dentro, não dá final feliz pros outros tripulantes. De novo, [e óbvio, mas n~eo era isso que os dados que chegaram mostravam.

Da mesma maneira, imprensa não vai noticiar o que acontece em São João do Jaguaribe. Não dá notícia. Ninguém se importa. Também não vão noticiar que a Unidade da Federação mais violenta é a Bahia (dados do IPEA). Mas não é noticiado isso em larga escala. Como foi mencionado em uma das reportagens, atrelam ao município de Queimados ao Rio de Janeiro, que muitos confundirão com a cidade.

Ah, isso significa que o Rio é que nem aquelas capas da revista Sentinela? Não, claro que não. Ainda mais considerando que é a segunda maior cidade do país. A percepção irá mudar. Ninguém vai noticiar um assalto em Curicica, mas vai em Copacabana. Ninguém vai noticiar algum crime que ocorrer em Vargem Grande, mas sim no Recreio dos Bandeirantes. A percepção vai mudar.

Uma vez me falaram que se sentiam menos seguros em locais altamente policiados, pois isso seria indicativo de ter assaltos lá, mas isso é extremamente idiota. Se um lugar é altamente policiado é justamente para coibir crimes. Eu não sei vocês, mas se eu fosse criminoso, eu iria para um lugar que não estivesse lotado de policiais armados até os dentes. Quando fui para gramado, estava conversando com um motorista de Uber e comentei “interessante que aqui não vemos um policial nas ruas”

Ao que ele respondeu: “o senhor não vê porque não é para ver. mas pode ter certeza que se acontecer algo, eles estarão lá imediatamente.”

Gramado não precisa de policiamento ostensivo, cidades grandes e enormes precisam. Você anda a Times Square e vai dar de cara com viaturas da polícia em cada esquina. Você se sentirá mais seguro lá para puxar sua DSLR e tirar fotos ou em Capão Redondo?

Porque, sim, gente, apesar do que dizem, existe tráfico de drogas, criminosos, violência em todas as grandes cidades. Não tente inventar que na sua não tem. Se numa delas os criminosos são pegos e punidos, não seria este um exemplo a ser seguido, ao invés de criticado? Porque, convenhamos, os políticos aí da sua cidade ou estado podem até ser anjinhos. Sabem quem também era? Pois, é. Ele mesmo: Shemihaza.

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