O Grande Facebook espiona seu irmão (ou algo assim)

Me mandaram uma notícia que larga maioria comentou, mas deixou passar o Diabo, que sempre está nos detalhes. De tudo e por tudo, devemos ser críticos com o que cai em nossas mãos, e se você pensa que ceticismo é sobre religiões, parabéns, você é um imbecil. A notícia era sobre um corte no auxílio dado pelo INSS por depressão, sendo que uma verificada no perfil facebookiano da pessoa mostrou que ela supostamente estaria muito feliz e não precisava do benefício. Conseguem ver algo de errado nisso?

O caso aconteceu em Ribeirão Preto, e começa com uma santa senhora que foi num médico e pediu afastamento. Um perito do INSS atestou que a profissional apresentava depressão grave e declarou-a como incapaz temporariamente para o trabalho. Nova perícia um ano depois, mesmo laudo, continuando com o auxílio-doença. Isso rola desde 2013.

O problema se deu quando a Procuradoria Seccional Federal (PSF) demonstrou que a distinta segurada não apresentava os sintomas de pessoas com depressão grave. Eles chegaram a essa conclusão depois que ficaram fuçando o Facebook da moça, vendo postagens e fotos nas quais ela parecia bem. Todo mundo ficou rindo na base do "HAHAHAHA, se ferrou", mas eu sempre vejo as coisas por outros ângulos também.

De princípio, deixo claro que não estou interessado em saber se ela deu um cano no INSS ou não. O que me chamou a atenção foi:

1) Como descobriram o Facebook dela?
2) É tarefa de um perito do INSS ficar no Facebook o dia todo, fuxicando se os segurados têm perfil lá? E Twitter?
3) Facebook está listado como parâmetro de análise para determinação da saúde de uma pessoa?

Houve o caso de um atendente da Net que usou os dados cadastrais de uma cliente para assediá-la. Isso deu uma imensa repercussão. A Net demitiu o imbecil, e eu achei até que foi pouco, mas sempre existem medidas judiciais, e não vou discutir se é a empresa a responsável pelo que o idiota fez ou não.

Me fiz a pergunta: na fica cadastral do INSS vem o endereço do perfil dos segurados no Facebook? Se o perito descobriu, é porque ficou gastando recursos públicos para fazê-lo, coisa que não é de sua alçada. Se ficou investigando dados que não constam no cadastro do segurado, isso não é invasão de privacidade? Até mesmo para a polícia investigar o suspeito de um crime é preciso ordem judicial para grampear seu telefone e quebrar sigilo bancário, mas o bonzão do INSS parece estar acima disso. Ou será que ele tinha ordem judicial para fazê-lo?

Sim, tinha, sim. Aham!

Então, se o distinto perito fuçou o perfil da preclara segurada, posso ter plena certeza que ele verifica o perfil de todo mundo, certo? Seus dados pessoais, fotos etc. Isso não seria stalking? E quem é o responsável? Ele ou o Estado? E se alguém entrar com pedido de licença por problemas na coluna, acompanhar a filha numa academia e tirar foto lá? Essa pessoa seria julgada e sentenciada a ter seu benefício cortado, pois, "se está na academia está muito bem de saúde"? Qual é o critério?

Eu escrevi há um certo tempinho um artigo mostrando que não temos privacidade (v. Uma fofoca sobre a privacidade). Somos vigiados por todos, um moleque que mal tem o ensino médio sabe meus dados da Receita Federal. Quem me garante que não podem escolher quem será assaltado, sequestrado etc.? Se qualquer um pode dispor de todos os meus dados sem minha permissão, podendo agir como juiz, júri e executor, limando o mínimo direito à privacidade, que país é este que alegam ser uma democracia? Não é diferente da maior máquina de segurança do mundo: O Comitê de Segurança do Estado, o KGB. Hoje, essa máquina é a Internet e todos os usuários são seus agentes. Não temos como nos esconder. Talvez, das pessoas, mas não das corporações, sejam públicas ou provadas.

É um pensamento aterrador, se você parar para pensar, mas é algo que temos que conviver, como os antigos soviéticos tinham que conviver com o KGB, que estimulava que os próprios vizinhos vigiassem e denunciassem qualquer um, sob qualquer pretextos. Os oficiais é que se encarregariam de verificar e extrair melhores informações dos acusados, que poderiam ir parar em Lubyanka, apenas porque tropeçou no gato da vizinha.

Hoje foi essa segurada sem-noção do INSS. Amanhã será você, pouco importando o motivo. Vamos ver se você achará engraçado.


Fonte: Extra

11 comentários em “O Grande Facebook espiona seu irmão (ou algo assim)

  1. A regra, nesse caso, é a mesma pra todos: quer ter privacidade na internet? Pra começar, não abra tenha contas ou perfis no Google, Facebook, Twitter, Instagram, etc.
    Já vi um documentário sobre fraudes no seguro saúde nos EUA, onde os investigadores munidos de câmeras, chegam a seguir os passos beneficiários, quando desconfiam de algo. E aí, o cara que chega lá de muleta, com supostos problemas da coluna, de repente é flagrado jogando beisebol ou carregando uma geladeira na mudança. O cara perde o benefício e ainda responde pelo crime. Tudo isso, lá, é feito legalmente.
    De resto, num país onde alguém é mantido em prisão preventiva com base numa denúncia sem provas contida numa reportagem da Veja, usar o Facebook como parâmetro pra suspender benefício da tal mulher, não parece tão estranho. Se bem que as pessoas tendem a exagerar e mentir sobre o verdadeiro estado de espírito nas redes sociais.

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    1. Me parece que o problema não é somente ter um determinado perfil numa rede social, mas sim o desejo patológico de querer mostrar toda a sua vida para todo o mundo. Sou avesso a redes sociais porque não tenho saco para ficar lendo futilidades e vendo fotinhas de pessoas felizes e bem resolvidas / memes toscos / coisas do tipo. Posso estar generalizando (generalizações são sempre perigosas), mas a grande maioria dos usuários facebokianos escancara a sua vida por meio de likes, fotos upadas, comentários, etc – sem nem ao menos refletir sobre isso, nem que seja por um segundo sequer.

      Eu li há uns quatro meses atrás sobre uma quadrilha que foi investigada e presa aqui no Brasil por praticar fraudes com cartões bancários. Sabe como eles conseguiam os dados? Ameaçando as vítimas com armas? Não. Usando a maquininha Chupa-cabras? Também não. Eles simplesmente digitavam “meu cartão novo” na busca do Facebok e Twitter, e então apareciam milhares de resultados com pessoas postando a foto de seus cartões recém-enviados pelo banco e ainda bloqueados. Milhares de resultados, numa busca que não leva mais que trinta segundos! Aí fica fácil. O problema é do Facebook e do Twitter? Se amanhã inventarem o Tabajarabook, as pessoas continuarão postando a foto de seus cartões bancários novinhos, em alta resolução.

      Acabei me empolgando, e sobre o texto em si, também não concordo com essa atitude do funcionário do INSS, mas não custa nada levar a privacidade um pouco mais a sério.

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  2. Não é preciso ter ordem judicial para ter acesso a algo público. Se qualquer um pode ter acesso por meios legais, o governo também pode. Postar algo no facebook é como colocar um mural em frente à sua casa com suas informações.
    Mas acho que não deveriam ter chegado a essa conclusão pelo perfil da mulher. As pessoas tem necessidade de se mostrarem felizes para os seus conhecidos, principalmente deprimidos no facebook.

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    1. Especialmente porque a depressão “está lá”, se a mulher tem “alguns momentos de felicidade”, conforme “comprovado pelas fotos” não significa que ela esteja curada. Sei disso pessoalmente, tenho pessoas da família com essa doença e não é assim tão simples, do tipo “está feliz = está curada”. O buraco é bem mais embaixo.

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      1. Tenho uma cunhada que é pensionista. Ela teve problemas no parto e sofreu alguns danos no cérebro, que causaram atrofia em sua mão e perna direita.
        Porém, ela recebe a pensão por depressão.
        Sua vida é um inferno, com remédios fortíssimos e noites insones.
        Quem tem acesso ao Facebook dela e não sabe disso, não acreditaria que ela é doente.
        São MILHARES de fotos (muita selfie) na praia, na balada, em viajens, na academia e em TODAS ela está sorrindo.

        Porém, todos sabemos que é uma válvula de escape, uma “máscara”.

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  3. Isso me lembrou de um juiz proibindo o sacrificio de cães soropositivos para calazar e recomendando o tratamento dos animais enfermos, desconhecendo totalmente a realidade do país em que vive.

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  4. Verdadeiro absurdo tal critério, vejamos.

    Acerca do assunto, desde o começo das redes sociais eu sabia que era algo feito, primariamente, para espionar pessoas (pesquisar seus gostos etc.); quem garante que o Facebook não vende informações, dados etc (é bem provável que tenha um sistema de gráficos, com várias variáveis).

    Solução para isso? Criar uma conta anônima (ao menos resguardaria a pessoa)
    Em se tratando do Facebook, é pior nessa questão, pois é bem complicado criar uma conta anônima….

    Desnecessário lastrear com pesquisas para dizer o que vou dizer (estou com preguiça de procurar a fonte, sorry), mas há pesquisas que apontam que quem usa o Facebook há grande possibilidade de estar em depressão. É que todo o mundo mostra uma vida tão emocionante que acaba por desanimar outras pessoas com suas vidas não tão emocionantes.

    Finalizando meu comentário, pode ser que a pessoa em comento possa ter enganado o INSS, todavia, pode ser que não. Ela pode realmente sofrer de depressão, sendo que a conta do Facebook dela reflete aquilo que ela quer mostrar para os outros usuários, p. ex., como sendo uma pessoa divertida, festeira etc.

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  5. Quer dizer que se eu estiver de licença por causa de uma tendinite no punho perderei o benefício se descobrirem que eu acessava o xvideos?

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