Formigas-de-fogo: guerreiras, escravagistas e destruidoras de impérios

O exército não planejou o ataque, mas seus soldados são disciplinados, bem treinados, organizados e decididos. Eles viram que os Estados Unidos da América ofereciam um amplo território e recursos praticamente infinitos, além de escravos prontos a lhes servir. O exército percebeu que ali reina um imenso repositório do que para este exército é a ambrosia: alimentos altamente calóricos, deliciosamente riquíssimos em carboidratos e plenamente disponíveis em qualquer quarteirão. Se para você um Big Mac é o Caminho, a Verdade e a Vida, para as formigas é um verdadeiro manjar dos deuses, e as formigas-de-fogo – Solenopsis invicta – lutarão até o último inseto pelo seu prêmio.

A formiga-de-fogo não é nenhum soldado suicida.  Elas são mais inteligentes que isso. Também não andam metendo o pé na jaca por aí, a ponto de estarem sempre de porre. Esta miserável é a desejada de todas as nações: todo mundo deseja ardentemente dar um fim nelas. Esta coisa é responsável por atacar vorazmente. Nos EUA, estas desavergonhadas são responsáveis por um prejuízo anual de cerca de US$ 6 bilhões, entre danos à agricultura e gastos com o controle dos insetos. O problema é que a S. invicta não é natural de lá. Elas são originárias da América do Sul, especialmente o Brasil, onde são chamadas também de "formiga lava pés". Elas chegaram aos EUA a partir da década de 1930, a bordo de navios cargueiros, espalhando-se primariamente pelo sudoeste dos EUA e, agora, estão se espalhando pela China, Taiwan, Austrália e Nova Zelândia desde a década de 1990.

A capacidade de dispersão destas formigas deve-se ao seu hábito reprodutivo, alimentar, capacidade adaptativa e agressividade. São formigas muito agressivas, onívoras, poligênicas, polimórficas e que vivem em áreas abertas. Assim, rapidamente se dispersam, invadindo e adaptando-se a ambientes perturbados ou não, podendo dominar esses locais dependendo das condições existentes, como foi o caso de sua invasão às Cidades de Envira e Euruenepe no Estado do Amazonas (fonte).

Esta criatura — que só pode ter sido criada por Sheitan, o Execrável, ou por Javé quando ninguém contribuiu com a quermesse — chega bombando, mandando outras formigas (as benéficas) pra vala, destroem plantações,  atacam equipamentos elétricos (!), e se já não bastassem tem uma "mordida" (sim, eu sei) pra lá de dolorosa, justificando o seu nome. Em 2010, cientistas sequenciaram seu genoma, publicando os resultados na PNAS. A meta era tentar entender melhor quem é esta desgracenta para poder dar um fim nela de uma vez por todas.

Agora, chegou a vez do dr. Shawn Wilder, da Faculdade de Ciências Biológicas da Universidade de Sidney. Ele descobriu que esta invasão em larga escala tem sido impulsionado pelas parcerias com os insetos locais, que muito provavelmente são discípulos de Benedict Arnold (não digo. Vai estudar!). As formigas-de-fogo possuem um programa de Corações-e-Mentes, que nem os boinas verdes e estabeleceram algo como um esquema de proteção para pulgões e outros insetos, defendendo-os de outros atacantes. Em troca, esses pulgões e outros afídios produzem a chamada melada, uma espécie de seiva muito rica em açúcares, praticamente um McDonald’s biológico e que deixa as formiguinhas muito felizes e fortinhas, prontas para aniquilar seus inimigos e matar, dizimar e destruir. MUAHAHAHAHAHAHAHAHA!

Assim, temos um perfeito exemplo de simbiose por mutalismo, onde as formigas possuem servos e são, por isso, chamadas de "formigas pastoras", tendo vários insetinhos trabalhando para elas e dando graças ao Deus Formigão por mais um dia de vida. E, lembrem-se: humanos são antiéticos pois estes escravizam pessoas e as fazem trabalhar em condições precárias. A Natureza é bela e ética. `Perguntem a qualquer vegan.

O dr. Gene Wilder, digo, Shawn Wilder viajou para a Argentina e encontrou formigas-de-fogo em cerca de 5% das árvores locais, apenas, sendo que estas apenas se beneficiavam de 2% da melada produzida pelos insetos locais. Em contraposição, nos Estados Unidos, as formigas-de-fogo estão espalhadas  em torno de 40% das árvores dentro de seu alcance, tendo controle de 75% (!) sobre os insetos que produzem a deliciosa melada. Difícil de entender? Seleção Natural, meu filho, Seleção Natural. As formigas-de-fogo, não sendo originárias dos EUA, não possuem competidores diretos e nem predadores suficientes. Dessa forma, aqueles trastes se espalham que nem notícia ruim e implantam seu "sistema comunista insético". Lênin ficaria orgulhoso ao ver as trabalhadoras dominando os meios de produção!

Altas fontes energéticas, um organismo adaptado a estiagens prolongadas assim como a inundações, características do clima de seu habitat original e virtual falta de competidores proveram à formiga-fogo tudo que ela precisava para expandir seus domínios e dominar tudo o que estiver ao seu alcance. Maiores fontes de melada, maiores colônias. Maiores colônias implicam em maiores soldados e "fazendeiros", dominando mais fontes de melada e assim sucessivamente.

Eu já falei que a Natureza é ética?

As pesquisas do dr. Billy Wilder, digo, Shawn Wilder – publicadas no periódico PNAS – esclarecem mais sobre como é o comportamento das S. invicta. Isso pode ajudar no combate a essa desgraça e, juntamente com o sequenciamento de seu genoma, espera-se conter o avanço deste exército voraz. Mais voraz que qualquer exército que já pisou na face da Terra, comandados pelos antiéticos humanos.

9 comentários em “Formigas-de-fogo: guerreiras, escravagistas e destruidoras de impérios

  1. Em minha terra natal (RS) ela é muito comum e sou testemunha viva da dor que a “mordida” delas causa.

    Inclusive, “O Negrinho do Pastoreio” (Pesquise, é uma bela história, teve até filme com o Grande Otelo) foi torturado e morto em um formigueiro delas.

    E sim, elas fazem sua colônias em quase qualquer lugar: grama, areia, terra…

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  2. As vezes eu acho que o André só publica as notícias em que ele consegue fazer no mínimo UMA piada com o nome do pesquisador… hauhauhaua :razz:

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  3. É, nesse exemplo vemos como na natureza é tudo bonitinho e ético, os animais vivem em paz e harmonia, como num conto de fadas. Ainda não entendo porque vegans acham errado o animal ser-humano se alimentar de animais inferiores para sobreviver.

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