Bactérias antigas já eram imunes a alguns antibióticos de hoje

Eu fico contente em saber que vivo num mundo onde a Evolução não existe. Tudo maravilhosamente imutável, onde as espécies não sofrem nenhuma mudança e as pragas podem ser facilmente controladas, pois o mesmo remédio pode ser usado várias vezes, aniquilando de vez aqueles seres malévolos que causam doenças. Infelizmente, bactérias ateias não se dão conta disso e continuam sofrendo mutações, muitas vezes ajudando-as a sobreviver e causar mais problemas ainda, pois deixam de ser vulneráveis aos antibióticos mais fortes, e isso acontece desde muito antes de Noé ter visto a primeira chuvinha de verão ou mesmo do Homo sapiens ter dado as caras nos quintais de acá.

Desde sempre, o meio conspira para mandar todos os seres vivos pro ralo. Sim, meu sei que há aquela ideia romântica que o mundo é belo, está prontinho, quentinho e adequado para receber a vida. Ahan, tá. Então explode um vulcão, um tremor de terra gera um tsunami ou um meteoro cai no seu quengo. Se isso é uma forma de lhe proteger, eu quero meu dinheiro de volta, o qual usarei para comprar filtro solar, já que as emanações de raios ultra-violeta vindos do Sol estão tentando a todo custo me dar um câncer de pele.

O meio cria uma ambiente danoso, não porque ele quer matar todo mundo, obviamente. Cria-se algo assim por causa de eventos caóticos; da mesma maneira, não procura criar um lugar aprazível para ninguém. Você só deu sorte de nascer num país que não está entre duas (ou mais, no caso do Japão) placas tectônicas, nem tem alta atividade vulcânica. Em compensação, tem aquela história do povinho que colocaram por aqui, digo, por aí, no Brasil. Nós, de Tuvalu, demos maior sorte.

Bactérias, como quaisquer outros seres vivos, vivem este dilema, pois estão jogadas no meio de um planeta que pouco se importa se elas vivem ou morrem (não que o mundo se importe mais com seres humanos, é claro). Elas vêm percorrendo um longo e penoso percurso ao longo do tempo, com vários fatores externos hostis e prontos para aniquilá-las. Mas elas sempre prosseguem, onde cada adaptação positiva deu um suspiro a mais e a possibilidade de continuar existindo.

Ao contrário do que se pode pensar, bactérias não se adaptam automaticamente ao entrarem em contato com um meio nocivo de, digamos, substâncias antibióticas. Há muito, muito tempo, muitas bactérias já estavam imunes a antibióticos modernos, demonstrando que uma adaptação não tem fim imediato, ele apenas é usado no caso de aparecer uma situação de risco. Um exemplo é a cepa de bactérias encontradas nas geladas terras do Alasca.

A drª Vanessa D’Costa e a drª Christine King do Departamento de Bioquímica e Ciências Biomédicas da Universidade McMaster estudam bactérias com milênios de idade.  Elas efetuaram análises metagenômicas em DNA de bactérias com mais de 30.000 anos de idade, presas em camadas permafrost na região da Beríngia (trecho perto entre o Alasca e a Sibéria, separados pelo estreito de Bering.

Uma análise metagenômica é feita com exemplares de diversas regiões, de forma a fazer um estudo dos diversos trechos genéticos, vindos de diferentes regiões, de forma a fazer um levantamento estatístico mais acurado.

Na pesquisa, as duas pesquisadoras fizeram ensaios para testar o grau de resistência dessas bactérias frente a modernos antibióticos, como tetraciclina e vancomicina, e o resultado foi que muitas cepas apresentaram grande resistência a estes medicamentos, o que elucida e assusta ao mesmo tempo. Elucida no ponto que muitas mutações não têm data para acontecer. Elas simplesmente acontecem. Elas podem ser positivas, neutras ou deletérias em relação ao sistema circundante; sendo assim, a mutação só será grande coisa mediante o que ela pode fazer pelo (ou contra) o ser vivo. Isso assusta, pois se estas desgramadas bactérias estivessem à solta, elas dariam muitos problemas e novos medicamentos teriam que ser desenvolvidos, e bem rápido.

A pesquisa foi publicada no periódico Nature, e demonstra que você pode bancar o espertinho o quanto quiser, tentando prever qual seria o melhor método para abalar geral com aqueles seres do inferno, testando logo de saída os antibióticos então disponíveis, para só saber depois que algumas parentas dessas bactérias já haviam desenvolvido resistência a eles, deixando seu dia mais irritante, enquanto elas saem por aí cantando Friday.

Você nunca esperou que o mundo natural fosse justo, esperou?

3 comentários em “Bactérias antigas já eram imunes a alguns antibióticos de hoje

  1. Vendo já pensei numa possibilidade de “preverem” tais situações assim. Não exatamente antibióticos, pois estes são compostos de substâncias que podemos encontrar na Natureza. Se bem que talvez os extremófilos mostram que os seres vivos podem viver numa boa em ambientes muitos mais hostis do que um organismo “contaminado” com antibióticos.

    Uma dúvida, o fato das bactérias serem bem pouco longevas ajuda na sua rápida evolução?

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  2. As bactérias fazem-me lembrar do nosso breve período na terra.
    “complexidade” em um ser vivo é sinônimo de “várias frescuras e fatores para sobreviver em um ambiente”…por isso as bactérias são rock’n roll :mrgreen:

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