Reprogramando o cérebro contra as drogas

por Nikhil Swaminathan

Pela primeira vez, cientistas identificaram transformações de longo prazo no cérebro de camundongos que podem trazer alguma luz à questão da dependência de drogas – nesse caso, de metanfetaminas – e da enorme dificuldade de se livrar do hábito. As descobertas, relatadas na publicação especializada Neuron, podem abrir caminho para novas maneiras de acabar com a necessidade de drogas – e ajudar os dependentes a se libertarem delas.

Utilizando um rastreador com pigmento fluorescente, os pesquisadores descobriram que camundongos que receberam metanfetaminas por 10 dias (mais ou menos o equivalente a uma pessoa fazer uso da droga por dois dias), tiveram a atividade suprimida em uma determinada área do cérebro. Para a surpresa dos cientistas, essa área não voltou a funcionar normalmente nem quando a droga deixou de ser oferecida, mas recuperou suas funções quando eles administraram uma única dose da droga novamente, depois que os camundongos já estavam em “abstinência”.

O co-autor do estudo, Nigel Bamford, neurologista pediátrico na Escola de Medicina da University of Washington, afirma que, se uma mudança semelhante acontecer em humanos, será um sinal de que tratamentos que enfocam a área afetada sejam uma maneira eficaz de lutar contra a dependência. Essa área, no caso, é o estriado, uma região do cérebro anterior que controla o movimento, mas também está ligada ao comportamento de formação de hábitos.

Pesquisas anteriores demonstraram que a droga estimula os neurônios no cérebro intermediário para liberar dopamina nas sinapses (conexões entre os neurônios) no estriado. A dopamina (que está ligada ao processo de recompensa, motivação e atenção) é um dos neurotransmissores primários do cérebro – os mensageiros químicos pelos quais um neurônio faz com que seu vizinho dispare um impulso nervoso.

Nesse caso, afirma Bamford, a dopamina em excesso afeta o fluxo de informação vindo do córtex (a unidade central de processamento do cérebro) para o estriado. Mais especificamente, ela parece impedir parcialmente que os neurônios no córtex liberem glutamina, outro neurotransmissor, responsável pelo estado de excitação. “A dopamina provoca um efeito que ajuda a pessoa a se concentrar em um novo objeto ou um estímulo prazeroso”, explica Bamford. Dopamina demais poderia explicar um comportamento compulsivo ou de dependência, pois levaria o usuário a ignorar outras coisas e dedicar muita atenção a um objetivo específico.

Os pesquisadores descobriram que o uso prolongado da droga manteve o cérebro em estado de “depressão crônica”, basicamente suprimindo os terminais neurais que controlam o fluxo de sinais entre o córtex e o estriado – mesmo após um longo período de várias semanas. No entanto, a atividade normal foi retomada logo depois que a droga foi reintroduzida.

Bamford acredita que a resposta esteja em outros neurônios encontrados no estriado, que liberam o neurotransmissor acetilcolina – que, segundo ele, age como uma “chave da memória”. Quando a dopamina é liberada pelo uso de metanfetaminas, reduz os níveis de acetilcolina no estriado; o uso contínuo da droga o reduz a 10% do normal. Essa diminuição, por sua vez, afeta os níveis de glutamato, que também caem perigosamente, resultando na depressão crônica do fluxo de informação no cérebro.

Quando a metanfetamina é administrada após um período de abstinência, no entanto, a dopamina liberada pelos neurônios do cérebro intermediário tem o efeito oposto nas células de acetilcolina, fazendo com que liberem a substância química no estriado. Isso, por sua vez, estimula a produção de glutamato, fazendo, de alguma forma, com que o sistema se “reprograme” para um estado pré-dependência.

Bamford diz que, se os pesquisadores pudessem apontar esse mecanismo de reprogramação, isso permitiria a criação de drogas que não causam dependência para desencadear o processo.

“A identificação desse mecanismo bem complicado nos dá oportunidades diferentes para lidar com a raiz do problema, para que as sinapses sejam normalizadas sem o uso de um psicoestimulante”, explica. “Um objetivo ainda melhor seria determinar como esses neurônios de acetilcolina aprendem a ficar deprimidos, e trabalhar diretamente com eles.”


Fonte: Scientific American Brasil

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