Analisando séries e filmes de super-heróis II

A força além da super-força

Tudo bem, você acha que o primeiro super-herói foi o Super-Homem. Não foi. A ideia de criar super-humanos já estava presente mesmo em Bewoulf, mas se formos ver bem. Hércules era um semideus e Aquiles foi mergulhado no rio Estige e ganhou invulnerabilidade. O problema é que a mãe dele era idiota e não mergulhou totalmente, deixando os pés e tornozelos de fora. O calcanhar de Aquiles era seu Calcanhar de Aquiles, sua Kriptonita.

A Bíblia tem Sansão, cuja Kriptonita são seus cabelos, mas o grande ponto de virada é de onde vem o poder destes heróis. No caso de Sansão, vem da sua fé no deus Jeová. No caso do Super-Homem, o poder vem do Sol amarelo, mas isso foi escrito e reescrito várias vezes. Sempre com um reforçozinho para ficar o mais próximo do que diria a Ciência. Antes, ele poderia saltar longas distâncias porque ele nasceu em Krypton, um mundo com uma gravidade maior que a da Terra, mas isso não surtiria muito efeito, já que ele cresceu aqui então, no máximo, seus músculos fariam menos esforço e seriam atrofiados. Atualmente, o “Sol amarelo” lhe dá força e carrega suas baterias moleculares de suas células, criando uma espécie de campo de força. Isso lhe dá até capacidade de voar, mas essa capacidade veio de uma adaptação feita para a TV.

Max Fleischer foi um ícone da animação. Criador de Betty Boop e do Popeye, Fleischer montou um estúdio com grandes inovações. Uma delas foi a rotoscopia, a técnica de redesenhar quadros para serem usados em animação, sendo um precursor da captura de movimentos. Enquanto desenhos tinham fundos estáticos, normalmente repetitivos para economizar tempo na produção dos desenhos, a rotoscopia fazia com que o personagem animado interagisse melhor com o cenário. Tendo em vista que as Aventuras do Super-Homem não fazem feio perante nenhum desenho de hoje, pode-se dizer que houve mais retrocesso do que inovação e nem mesmo a Disney estava páreo para o trabalho de Fleischer, cuja técnica de rotoscopia é usada até hoje para a produção dos modernos filmes. O equipamento evoluiu, mas a técnica continua com os mesmos fundamentos.

O Super-Homem só passou a voar nos desenhos de Fleischer por causa das limitações da animação da época e porque teria um gasto maior na produção. Por isso, ele passou a voar, mas sem ser desinteressante. Ele interage com o cenário de fundo, como o céu, as nuvens, os prédios etc. Hoje, os principais heróis voam. Até a Mulher Maravilha passou a voar mas ela ficará para um outro dia.

O Kaptain Kristian tem um excelente vídeo (está legendado em português) sobre o desenho (na minha época chamávamos qualquer animação de desenho, mesmo):

Mas quem é o Super-Homem? Eu digo: o mais complexo personagem da DC. Acham que é fácil e desinteressante ser o Super-Homem. Ele tem superforça, voa, visão de raio-X, visão telescópica, visão microscópica, sopro congelante, visão de calor, velocidade relativística até, mas chega ou cairemos naquelas loucuras quando pessoal perdeu a mão e o Super passou a arrastar planetas inteiros pela galáxia, o que seria um absurdo se não pela catástrofe espacial como pelo fato do poder dele estaria apenas ao alcance da energia emanada pelo nosso Sol.


Menos, pessoal. MENOS!

Acham que é um semi-deus e, por isso não tem graça. É uma interpretação simplista. O Super tem o problema de ele ser isso tudo, então, escrever histórias para ele é fácil. Ele poderia acabar com Lex Luthor só com um zap dos olhos. Mas aí há um diferencial: seus pais adotivos. Sua criação o fez ter um senso de honestidade e ética maior que seu super poder. Seu imenso coração faz com que ele seja mais vulnerável do que simplesmente colocassem kryptonita (que com sua super-velocidade poderia se ver livre de cada pedaço caído aqui na Terra). Entendemos quem é o Super-Homem em histórias como Allstar Superman. A longuíssima exposição ao Sol o fez desenvolver uma doença incurável. Ele está morrendo e tira seus últimos momentos para salvar as pessoas, entre elas uma suicida. Suas palavras de conforto foram maiores que quaisquer superpoderes, e não só apenas salvou uma personagem fictícia, como uma pessoa real.

Isso aconteceu de novo. O uso de elementos como pessoas prestes a dar cabo à própria vida mostra mais do Super, quando ele relutante promete que NÃO vai salvar a moça prestes a se matar se esta for sua vontade, mas conversa com ele e oferece sua mão, oferece empatia, oferece esperança. Isso que está acabando com os filmes.

https://imgur.com/gallery/Ijdxh

No filme do Homem de Aço, ele diz que o S em seu peito (antes era de Super, mesmo) significava Esperança. É o símbolo de sua família, a casa de El. Sua ética o fez gritar em desespero por ter que matar Zod. Foi um esforço descomunal mesmo para quem tem superforça tirar uma vida, pois era isso ou ver pessoas inocentes morrerem pelas mãos pelos olhos de Zod e sua visão de calor. O Super-Homem do filme de 1978 teve muito disso. Ele vem dos céus e salva o gatinho que subiu numa árvore, corta a cena e ele está salvando o Força Aérea 1, o avião que transporta o presidente americano (e para estar sendo referenciado por este nome, é porque o presidente estava a bordo). Gatinhos primeiros, o Líder do Mundo Livre, depois.

Acharam ruim o filme Homem de Aço, queriam um filme do Super-Homem sendo Super-Homem. Ao invés disso o Snyder fez um filme sobre o Clark. Nada de errado nisso e em nenhum momento é prometido o Super sendo Super. Pelo contrário! Ele aprende até como se voa. Diferente do filme de 1978 em que ele passa anos na Fortaleza da Solidão, estudando, se preparando e testando seus poderes, chegando lá adolescente e saindo um homem feito e preparado para fazer aquilo que nasceu para fazer.

Outra característica que ficou esquecida é que Clark Kent é essencialmente um repórter investigativo. Tudo bem que ele se aproveitou dos poderes do Super-Homem para ganhar o Pulitzer, mas isso foi para denunciar criminosos e agir em prol do jornalismo raiz, já que ele não é jornaleiro que publica vida de influencer.

No Batman x Superman (um filme que teve alguns maus percalços), ele age como um investigador, mas estava preso na trama de Lex Luthor. Não é tão difícil assim de acontecer, pois Luthor sempre foi mais inteligente e ardiloso (apesar que eu não teria escolhido aquele ator). Ainda assim, faltou algo no filme: a essência do Super-Homem. Essência essa que volta no filme da Liga da Justiça. Um filme que faltou mojo, em que a trilha sonora acertou com o tema individual de cada herói, mas falhou miseravelmente no tema do grupo, sendo meh, ao invés de algo grandioso. Na cena que Steppenwolf diz “Vocês são muito fracos para ver a verdade” (começa a trilha do Super, escrita pelo John Williams) e uma voz diz “Bem, eu acredito na Verdade”. Steppenwolf olha com medo (ele sabia muito bem o que viria) e o Super completa “Mas sou maior fã da Justiça” e dá-lhe um porradão.

Neste momento eu apontei: ESTE é o Super-Homem! Saber que é preciso agredir em busca do bem maior. Como na cena da animação da Liga quando ele fica puto da vida com Darkseid e diz “Eu sinto como se vivesse num mundo de papelão, tomo o cuidado constante para não quebrar nada nem machucar ninguém. Eu nunca me permito perder o controle, nem por um momento, pois alguém pode morrer. Mas você aguenta, não é, garotão? Temos aqui uma rara oportunidade de eu me soltar e mostrar a você a verdadeira extensão da minha força”.

O ponto principal do Super-Homem, ainda mais levando em conta que ele é um alienígena – é sua humanidade, mas quando sua humanidade se torna humana demais – ao perceber que perder tudo o que amava graças a uma artimanha do Coringa, temos o prenúncio da série Injustice: God Among Us, em que ele surta, mata o Coringa de forma brutal e instaura uma ditadura governada por metahumanos, sendo ele o governante absoluto.


O Coringa venceu!

No fundo, o grande dilema do Super-Homem é ter que viver como super-herói, pois sabe que o mundo precisa dele, e como ser humano, com suas fraquezas, sonhos e desejos. Tudo ele tem que sair para resolver, porque ele é o Super-Homem, mas tem horas que ele quer ser mais homem, que Super, e é esse o principal diferencial da DC para Marvel. Os personagens da DC são deuses querendo ser humanos enquanto os da Marvel são humanos querendo ser deuses, o que sempre leva aos maiores problemas.

Quando deuses tentam ser humanos, esquecendo da sua principal responsabilidade, temos o Flash tentando salvar a mãe e zoando com a linha temporal, ou a Mulher Maravilha que coloca seus sonhos acima de tudo e isso gera inúmeros problemas para si e para o mundo. Mas aí é assunto para outro artigo.

6 comentários em “Analisando séries e filmes de super-heróis II

  1. “tomo o cuidado constante para não quebrar nada nem machucar ninguém” depois ele faz o Darkside atravessar um bocado de prédio hehehe

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