O segredo das mulheres de ferro das tumbas celtas

Em um mundo onde o passado é frequentemente esquecido, a Arqueologia serve como uma ponte para as civilizações que vieram antes de nós, com uma lanterna procurando a verdade há muito enterrada. Essa luz pode iluminar recônditos escondidos e trazer até nós descobertas que desafiam tudo o que pensávamos saber sobre uma sociedade antiga. No coração da Europa da Idade do Ferro, vindos de um passado distante, os Celtas nos contam um pouco sua história muda através das evidências arqueológicas.

E isso graças a algumas tumbas.

O dr. Stephan Schiffels e Joscha Gretzinger são pesquisadores de Arqueogenética no Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva. Eles gostam de pesquisar o DNA de coisa antiga, um pouquinho mais antiga que sua avó.

O trabalho deles mostra como durante o início da Idade do Ferro (800 a 450 A.E.C.), na França, Alemanha e Suíça, apresentou-se as primeiras evidências de organização supra-regional ao norte dos Alpes. Muitas vezes referido como “Céltico primitivo”, sugerindo ligações provisórias com fenômenos culturais posteriores, a sua estrutura social e populacional permanece enigmática.

No trabalho dos dois pesquisadores (mais uma batelada de gente) foi apresentado dados genômicos e isotópicos de 31 indivíduos sepultados no sul da Alemanha, datados entre 616 e 200 A.E.C., identificando vários grupos biologicamente relacionados abrangendo três cemitérios de elite a uma distância de até 100 km um do outro. A análise genética de dois príncipes enterrados em algumas das tumbas celtas mais bem preservadas da Alemanha confirma uma relação familiar há muito suspeita.

Baseado em esforços de reconstrução de DNA, parece que pelo menos alguns clãs celtas giravam em torno de dinastias matrilineares em vez de patrilineares. Isso é particularmente interessante porque, ao contrário das eras romana e medieval, as fontes escritas das antigas sociedades alemãs são extremamente raras. Por causa disso, muito pouco pode ser confirmado sobre certos detalhes culturais, como a dinâmica de gênero.

Claro, isso não é levado em larga escala, principalmente quando sabemos que historiadores romanos como Tácito e Amiano Marcelino retratam mulheres liderando e participando de batalhas militares. Mas o quanto disso pode ser digno de crédito já que todos os escritos sobreviventes de Tácito são bem posteriores à morte dele? Bem, outro historiador da época, Cássio Dio, também relatou sobre os comportamentos dos celtas no quesito de liberdades sexuais, principalmente entre as mulheres celtas. Mas o que as evidências arqueológicas nos mostram?

Poucos lugares são mais ricos neste quesito do que os montes funerários de Eberdingen-Hochdorf e Asperg-Grafenbühl; descobertos no final da década de 1960, eles são alguns dos montes funerários principescos mais bem preservados da pré-história alemã, também conhecidos como Fürstengräber. Acreditava-se que foram construídos por volta de 530 A.E.C., as tumbas continham uma infinidade de relíquias, como ferramentas adornadas com ouro, móveis de bronze, joias de ferro, adagas e chapéus de casca de bétula.

Avanços recentes na análise do genoma, no entanto, permitiram que os pesquisadores dessem uma olhada mais de perto nos 31 indivíduos encontrados, coletaram amostras de dentes e ossos do ouvido interno e sequenciaram seus genomas. Esta análise revelou uma relação biológica próxima entre os dois enterros centrais. Com base nas datas de morte, estimativas de idade e semelhanças genéticas, determinou-se que a relação mais provável era a de tio e sobrinho.

Alguns pesquisadores interpretam estas informações a respeito dos falecidos como sendo “anciãos da aldeia”, que adquiriram o seu elevado status social através de realizações pessoais durante a sua vida sem a pré-condição de herança. A análise dos esqueletos também revelou outras ligações familiares. Por exemplo, uma bisavó e seu bisneto foram identificados, apesar de terem sido enterrados a mais de 90 km de distância e com um século de diferença. Além disso, descobriu-se que dois indivíduos eram descendentes de primos de primeiro grau, sugerindo que a endogamia pode ter sido mais comum entre as elites celtas do que se pensava anteriormente.

O argumento a favor do estatuto hereditário entre as famílias da elite é ainda apoiado pela combinação recorrente de símbolos de poder, como joias de ouro, recipientes preciosos para bebidas e carroças, associados à autoridade ritual dos príncipes e princesas falecidos. Um aspecto central de um sistema dinástico de poder hereditário é o parentesco biológico.

Embora existam outras formas de parentesco, incluindo o parentesco social, como o acolhimento ou a adoção, que são notoriamente difíceis de inferir a partir da arqueologia funerária, o parentesco biológico pode ser reconstruído de forma conclusiva usando dados genéticos, e o que se pôde evidenciar mediante o exame de DNA é que o status de elite era passado pela linhagem materna, o que era pouquíssimo comum naquela época.

A pesquisa foi publicada no periódico Nature Human Behaviour.

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