The Flash e a tortura do inevitável

Vi o filme The Flash com uma expectativa e esta expectativa foi atendida: ver o Batman do Michael Keaton sentando a porrada em bandido. Tinha Batman do Michael Keaton sentando a porrada em bandido e eu fiquei satisfeito, mas o filme não era só isso, era muito mais e o conjunto da obra ficou maravilhoso e surpreendente de uma maneira que eu mesmo não esperava.
Como resenha básica e leviana, o filme The Flash pode ser resumido na oração do teólogo Karl Paul Reinhold Niebuhr:
Senhor, conceda-me a serenidade
para aceitar aquilo que não posso mudar,
a coragem para mudar o que me for possível
e a sabedoria para saber discernir entre as duas.
E daqui por diante, será um festival de spoilers.
De início, eu devo dizer: Ezra Miller é um maníaco sociopata que deveria estar preso. O problema é que ele é um maníaco sociopata que deveria estar preso que foi um excelente Flash. Se me perguntassem, eu não teria escalado ele, mas por algum motivo que me escapa, a Warner não me consulta para tomar este tipo de decisão. De minha parte, eu preferiria o Grant Gustin, da serie da CW, mas deixemos isso de lado, já que eu falarei dele mais tarde.
O filme é baseado no quadrinho Flashpoint Paradox, mas bem baseado de leve, mesmo, e começa com piadinhas, e isso me fez levantar uma das sobrancelhas, já temendo virar algo engraçadalho como o filme do Shazam. Naquele contexto, foi engraçado que o Homem Mais Rápido do Mundo vive num mundo lento com pessoas lentas… lentas até para quem não é a pessoa mais rápida do mundo. Mas esta é Central City e o Flash é famoso, com fã-clube e tudo mais. Batman (chamarei de Bat-Affleck para facilitar saber quem é quem) o chama pra ajudar em Gotham porque o usual: vão soltar um vírus sei lá das quantas que vai mandar tudo pro cacete e a tarefa do Barry é salvar todo mundo no hospital, numa cena hilária como as do Mercúrio nos filmes dos X-Men (o Mercúrio do MCU é um corno que é morto com tiros).
Sim: o Batman… pediu… ajuda.
Na hora de parar os bandidos, quase dá ruim, já que os frascos com o vírus xexelento iam cair na água da baía de Gotham e todo mundo ia se ferrar. Como e por que, eu não sei e o filme não explica (™Melhor Pior Filme da Semana). Aí quem ajuda é a Mulher Maravilha que laça o pulso do Bat-Affleck e do Bandido e tudo acaba bem, com o Batman pagando mico ao ficar à mercê do Laço da Verdade.
Sim, o filme já começa te jogando na ação, o que é bem melhor que os filmes da Marvel, que demora 2 horas para acontecer algo. Aliás, o filme do Shazam 2 seguiu esta linha. Falarei sobre ele em outra oportunidade.
Entra a parte melodramática. O pai do Barry tá em cana, a mãe morta, o Barry com crise existencial. Então, ao sair correndo ele descobre que pode voltar no tempo mediante um ponto da Força de Aceleração. Prestem atenção nisso. Ele comenta com Bruce que pode até salvar os pais dele, ao que Bruce replica que é uma péssima ideia e pode destruir coisas, e Barry fica com cara de bundão. Nesse meio tempo, reaparece na vida dele a Iris West, que fez ponta no filme da Liga, quando Barry a salva de uma maneira tosca, já que a forma como o carro bate no caminhão não teria como ela ser catapultada, mas enfim.
Por sinal, os anos de intervalo entre a produção de Liga da Justiça e The Flash não foram muito legais com a atriz Kiersey Clemons, mas deixemos isso de lado.
Depois de pensar, Barry descobre como consertar tudo. Basta a mãe não esquecer de comprar molho de tomate. Ela vai querer fazer o prato, o pai não vai ao supermercado e o invasor não vai invadir e muito menos matar a mãe do Barry. Claro, isso implicaria que o invasor iria invadir enquanto o pai estivesse em casa e os dois seriam mortos. Aliás, quem era o invasor? Por que ele invadir? Não foi roubado nada, ou o pai não teria sido acusado de assassinato. Por que justo aquela casa? Isso foi explicado na série da CW (o Zoom filho da puta fez aquilo), mas não aqui e fica por isso mesmo.
Barry volta no tempo e corrige isso. Quando ele tenta retornar, vem outro velocista e dá-lhe um porradão, então, ele cai em outra linha do tempo e encontra seus pais vivos e bem e… horror dos horrores, ele encontra a si mesmo jovem, e é justamente no dia que ia ganhar os seus poderes, de forma superfácil, quase uma inconveniência (™Pitch Meetings).
O Barry desta linha do tempo é chato pra cacete, e eu tenho vontade de comê-lo de porrada. E o pior! Coisas estranhas estão acontecendo. O ator de De Volta para o Futuro é Eric Stoltz, outros filmes de sucesso são mencionados, mas com outros atores. Tá tudo zoneado. Bem, o Barry tem que levar o Barry para ganhar os seus poderes, ou o Barry não terá seus poderes no futuro.
Claro, dá tudo errado, e o Barry Jovem ganha poderes e o Barry Velho perde, e ao testar a sua (ausente) hipervelocidade mostra como a forma de correr dele é ridícula. Não apenas isso, ele vê que Zod tá vindo aí e se lembra quando ainda nem conhecia os seus poderes direito não pôde salvar muitas pessoas. Só tem uma coisa que ele pode fazer: achar o Super-Homem e pra isso ele precisa do Batman. Quando chegam na mansão Wayne, Barry Velho toma um piau de um tio cabeludo. Era o Bat-Keaton aquele que todos nós estávamos esperando e fomos pro cinema para vê-lo, e não o maníaco do Ezra.
Na conversa Bat-Keaton diz que Gotham é uma cidade absolutamente segura e não precisam mais do Batman. Curiosamente, o Bat-Keaton tinha matado o Coringa no Batman, O Filme, o que mostra que todos os outros Batmans (Batmen?) são idiotas e deveriam ter dado cabo do Coringa, o Palhaço, o Joker, que 99% dos problemas com criminosos de Gotham iriam sumir.
Por sinal, a explicação que o Bat-Keaton deu para o motivo de ter alterado um evento no passado alterou TUDO! Enquanto a animação fala que uma alteração no passado provoca ondas no tecido do espaço-tempo, no filme, tudo é explicado por um único ponto, e ao redor dele fica tudo zoneado.
Desde sempre, DC sabe trabalhar com conceitos de linhas de tempo e magia, coisa que a Marvel nunca conseguiu. Por isso que a Marvel foi tentar uma Crise nas Infinitas Terras e acabou piorando as coisas, em que temos linhas do tempo, multiversos e dimensões, cada coisa diferente da outra.
Barry Velho conversa com o Bat-Keaton sobre a motivação dele (salvar a mãe). Ficam no já batido chove não molha e Bat-Keaton reaparece já trajado de Batman e manda o famoso “I’m Batman”, frase que virou marca do Morcegoso justamente por causa do filme do Tim Burton.
O Bat-Computador descobre onde capturaram um alienígena, e só pode ser o Super-Homem. Depois de porradaria fantástica porque… Batman, né? A porrada é garantida, em excelentes cenas de luta. Ao chegar lá, encontram uma moça nuns trapos e uma roupa com o S, de Super-Homem, mas que é pra ser esperança, mas que se dane. Sempre será S de Super-Homem para mim.
Eles fogem e a moça é Kara Zor-El, prima do Super-Homem, a Supergirl. Ela estava fraca porque estava no subterrâneo, mas ali, no sol, ela vira… bem, ela vira o que é: uma kriptoniana foda pra caralho. A roupa fashion dela? Não sei, o filme não explica. Parece ser comum em Krypton, vai saber.
Chega na parte que ela faz cu doce e vai embora. Barry Velho precisa reaver os poderes e, claro, dá ruim e ele se erra todo. Para surpresa de ninguém, Kara volta, leva Barry Velho pras camadas mais altas da atmosfera, ele é eletrocutado sei lá como, ela o traz de volta e ele vira o Flash.
O diretor mandou o Snyder catar coquinho desde o início do filme. Os relâmpagos que o Flash solta não são aqueles azuis esmaecidos, eletrocutando tudo em volta. Os relampados e faíscas são vermelhos e amarelos como sempre foi o Flash nos quadrinhos e nas séries. Só o corno do Snyder quis ser diferente O Flash Novo que tem relâmpagos azuis, e isso é pra nós identificarmos quem é quem.
Kara vai pro pau com o Zod e descobre que o Zod tinha matado Kal-El ainda bebê. Kara se emputece e sai na porrada. Nada de cena escura, fumacenta ou empoeirada. O filme é claro. Dá gosto de ver Kara voando, as cores estão lindas (chupa, Marvel e seu tom desbotado), e é tudo muito vívido (chupa, Snyder, seu cuzão). Zod vence a Supergirl e precisa do sangue dela para reviver Krypton. Todo mundo tá se ferrando. Barry Jovem, como todo bom jovem, não quer abrir mão de salvar a mãe, mesmo Barry Velho explicando que ela é o ponto fulcral que deu merda. Barry Jovem vai à toda até chegar no ponto em que tudo pode ser mudado. Barry Velho atrás tenta impedir, mas Barry Novo fica tentando 5 trilhões de maneiras de impedir, mas sempre falha. Todo mundo morre e o mundo vai pro cacete. Pior que isso, as Realidades entram em colapso.
Quando Barry Velho tenta impedir, o Dark Flash chega e mete a porrada no Barry Velho, e aí vem a parte chocante: o Dark Flash é o Barry Novo depois de muitos anos tentando salvar a mãe. Barry Velho fala para ele ver tudo à sua volta, as múltiplas Terras começam a se chocar. Nós vemos diferentes Super-Homens, como o do George Reeves, o Christopher Reeves com a Supergirl da Helen Slater, o Super-Homem do Nicholas Cage enfrentando uma aranhona gigante, o Batman do Adam West, Jay Garrick correndo no mesmo continuum, tá tudo indo pro cacete!
Barry Novo compreende que algumas coisas simplesmente não têm solução e Barry Velho volta no ponto que ele alterou o passado e quando ia embora, viu como poderia salvar o pai pelo menos, em que ele só precisava de um motivo para olhar para a câmera de segurança. Ele faz e volta pro seu tempo. Tudo parece estar em ordem, até que Bruce Wayne chega com seu possante e ao saltar de carro, Barry viu que fez uma outra cagada: o Bruce Wayne agora não é mais Bem Affleck, é George Clooney. O filme acaba e é nesse ponto que eu pergunto se você sabe sobre o que é o filme.
O filme é a oração que eu coloquei mais acima: Aceitação. Há coisas que a gente tenta mudar e outras que simplesmente não tem como mudar. É preciso amadurecimento e compreensão para saber diferenciar, ou os resultados podem ser muito, mas muito ruins. O filme segue a velha tradição do Flash ser a causa e a solução dos problemas do universo DC e ele é lindo, tocante, emocionante, mas sem renunciar à ação. Bat-Keaton morre, mas morre como sempre viveu: um guerreiro. Passar anos sem ninguém precisar dele o estava corroendo, e ter algo pelo que lutar lhe deu novas forças para sair combatendo. Sua morte é honrosa e tocante. As cenas do Barry com sua mãe são maravilhosas e emocionantes também, e por increça que parível, O maluco do Ezra Miller entregou um bom Flash, esfregando aquela coisa tosca do Snyder no asfalto.
DC quis começar com um Crise nas Infinitas Terras cinematográfico, e por causa disso o diretor (como falei) cagou e andou pro que o Snyder fez.
Barry descobre nesse filme que pode voltar no tempo e ele já é integrante na Liga da Justiça. Acontece que no filme da Liga, versão Snyder, ele diz “você precisa quebrar a regra, Barry, você precisa quebrar a regra”, e volta no tempo para impedir que as Caixas Maternas mandem tudo pro saco. Só que foi ali que ele foi recrutado para a Liga que foi formada. Em outras palavras, Barry já tinha voltado no tempo e feito alguma cagada. Ele mesmo aparece em Crise Nas infinitas Terras da CW e encontra Grant Gustin e lá ele aprende que seu nome é Flash.
Em Liga da Justiça, Barry salva Iris West, e ela bem olha pra fuça dele, mas não o reconheceu ali. No filme do Flash, ela o conhece desde a faculdade, mas não faz menção que a salvou. Efeitos da mudança da linha do tempo no filme da Liga? Pode ser, mas eu não me sinto na obrigação de tampar furos.
Muita gente criticou o péssimo CGI no ponto fulcral de encontro das realidades. Comparando com os outros trocentos efeitos visuais, é nítido que aquela aberração era intencional, exceto talvez a parte dos bebês. Ali ficou estranho mesmo, mas nos créditos, com o cãozinho caindo, vemos o CGI muito maneiro.
Então o filme é ótimo? Sim, é. É um perfeito filme de super-heróis, é um perfeito filme baseado em quadrinhos. É uma perfeita homenagem a todos os atores que encenaram grande histórias que nós vimos na TV. É um imenso fanservice, e como disse o Jovem Nerd, eu sou fã, quero “service”. Todos os fãs ficaram maravilhados.
Mas… deu flop.
Eu já falei várias vezes antes: as pessoas não querem filmes de super-heróis. Nunca quiseram. E ao que eu percebo, a era dos filmes baseado em quadrinhos está passando. Quantumania fez apenas 476 milhões de dólares, e sendo Marvel, acostumada a abocanhar grandes quantias, deveria ser maior, certo? Flash fez 210 milhões até agora. E a própria Disney está tomando na cabeça, já que elementos está com 121 milhões de dólares de bilheteria. O que está acontecendo?
Os efeitos da Pandemia, claro. As pessoas aprenderam a ficar em casa e assistir pelo streaming. Isso aliado a ingressos de cinema cada vez mais caros, em que você paga estacionamento de shopping a preços abusivos e morre numa grana preta com pipoca e refri. O valor dos streamings está hiperbaixo, você assiste na hora que quiser e se tiver uma TV grandona, de 50 polegadas para cima e um sistema de som 7.1, a diferença pro cinema é nenhuma, porque o 3D é só para encarecer ingresso, mesmo. Aliás, pelos apps das redes de cinema dá até para comprar o brinde das promoções isoladamente, sem nem precisar ir ao cinema.
A culpa disso é das distribuidoras, porque a sala de cinema não lucra praticamente nada com a venda de ingressos. O lucro vem da pipoca. O shopping era cômodo pela segurança, mas se você vai com esposa/marido e uma criança, vai morrer numa grana preta, e já começa pelo estacionamento, como eu falei.
Quanto aos filmes de super-heróis, eu penso que irão reduzir muito. A saga daquela salada que ficou as linhas do tempo da Marvel, Kang versão Ezra Miller da Marvel, e tá tudo incerto. As produções da Marvel largaram mão de vez da qualidade naquela “o que a gente empurrar, aceitam”. Bem, não estão aceitando. E aí, como fica? Não fica., o cinema de uma forma geral perdeu qualidade. Vejam as produções e o Oscar a cada ano perde audiência justamente por causa de um monte de produção lixo. O mundo será das produções feitas para os streamings? Não sei, mas seja lá o que pretender fazer, acho melhor serem mais rápidos, a ponto de entrarem em contato com a Força de Aceleração.

Um comentário em “Analisando séries e filmes de super-heróis XXXI”