A golpista que virou finalista do Oscar do Absurdo

Tenho certeza de que o sonho de todo mundo é ter 12,6 milhões de euros em ouro, dinheiro vivo e Rolex enquanto está oficialmente desempregado, receber 1,6 milhão em benefícios sociais do governo austríaco, e ainda assim conseguir ser indicado para um prêmio. Não, não é o Nobel de Economia pela criatividade fiscal. É o “Goldenes Brett vorm Kopf” (algo como “Tábua Dourada na Testa”), entregue anualmente na Áustria e Alemanha para celebrar o maior absurdo pseudocientífico do ano.

Pense nisso como o Oscar da charlatanice, o Emmy da enganação, o Grammy do golpe. E a finalista de 2025 é uma sérvia de 44 anos que se apresentava como “Amela, a xamã”, mas cujo nome verdadeiro é Marijana M., ou Mariana, já que em sérvio o “j” tem som de “i”.

Desde 2011, os Céticos Vienenses da GWUP (Gesellschaft zur wissenschaftlichen Untersuchung von Parawissenschaften, ou Sociedade para Investigação Científica de Pseudociências) escolhem anualmente quem mais contribuiu para a causa do pensamento mágico travestido de realidade. E Marijana construiu uma carreira tão impressionante no ramo que merecia mesmo estar nessa final.

A história de Marijana, a Xamã Golpista (desculpem o pleonasmo), é tão perfeitamente previsível que chega a ser entediante em sua própria audácia. Ela percorreu Alemanha, Áustria e Suíça se apresentando como xamã e curandeira, convencendo pessoas de que estavam amaldiçoadas, que parentes morreriam em acidentes terríveis, que forças sombrias pairavam sobre suas famílias. A solução? Entregar dinheiro e joias para “rituais de purificação”. Spoiler: as coisas nunca voltavam.

Uma única vítima na Áustria entregou mais de 730 mil euros acreditando que salvaria a vida de um familiar. Outra perdeu 760 mil euros. Quando a polícia finalmente invadiu a villa da família em Maria-Enzersdorf, nas colinas vinícolas perto de Viena, descobriu um cenário digno de filme de máfia: um cofre escondido atrás de uma estante de livros contendo 25 kg de ouro em barras, milhões em dinheiro vivo de diversos países, máquinas de contar dinheiro, joias, relógios Rolex, e até um Mercedes banhado a ouro.

A ironia mais deliciosa? Enquanto operava este império de 12,6 milhões de euros em bens confiscados, a família de 15 pessoas oficialmente desempregada recebia cerca de 1,6 milhão de euros em benefícios sociais e auxílio-família desde 2016. Nada como complementar sua renda de xamã multimilionária com um bolsa-família austríaco. A diversificação de portfólio que nenhum consultor financeiro ousa recomendar.

Em 2002 e 2005, ela já havia sido presa na Alemanha por enganar seis mulheres em Munique, levando 214 mil euros. Saiu da prisão e foi direto para a Suíça, onde ganhou 13 meses de condicional por golpes similares. Em 2016, foi condenada em Viena a três anos de prisão. E ainda assim voltou ao batente. Se isso fosse uma startup, os investidores estariam aplaudindo tamanha resiliência.

O modus operandi era sempre o mesmo: as “videntes” Amela (Marijana) e Ana (sua nora Dona) abordavam as vítimas diretamente, diziam que podiam prever a morte de parentes em acidentes terríveis, e ofereciam rituais de purificação em troca de dinheiro e objetos de valor. Chegavam a fazer os rituais dentro de igrejas na Áustria, dando aquele toque de sacralidade ao teatro. Depois sumiam como fumaça. Como fumaça cara, é verdade, mas fumaça.

Agora Marijana está foragida, enquanto seu filho Francesco (29), a nora Dona (29) e o ex-marido Dejan (47) estão vendo o xamanismo nascer quadrado, acusados de fraude grave, lavagem de dinheiro e formação de organização criminosa. Uma verdadeira empresa familiar, onde cada um tinha seu papel bem definido no organograma do absurdo.

A participação de Marijana na final do “Tábua na Testa” é sintomática de algo maior: nossa relação coletiva com o pensamento mágico. Em 2024, o prêmio foi para o dispositivo “Healy”, um aparelhinho de 20 centavos vendido por até 4.500 euros que prometia curar depressão, ansiedade e fibromialgia através de “sensores quânticos” e “harmonização do campo bioenergético”.

Georg Wels, principal investigador do caso na Baixa Áustria, resumiu bem: “Elas enganavam pessoas. Fingiam que parentes morreriam em acidentes graves”. Simples assim. Nada de complexidade psicológica profunda. Apenas a velha e boa exploração do medo humano da morte e do desconhecido, embalada em incenso e conversa fiada.

Enquanto isso, a polícia austríaca publicou fotos das joias, relógios Rolex, anéis de diamante e até uma medalha de mérito encontradas no espólio da família, pedindo que vítimas reconheçam seus pertences. É como um Achados e Perdidos do absurdo: “Alguém perdeu esta fortuna ao tentar afastar maldições imaginárias? Favor comparecer à delegacia mais próxima com vergonha e comprovante de ingenuidade”.

A única coisa mais impressionante que a audácia de Mariana é o fato de que ela quase venceu. Durante anos, viajou pela Europa aperfeiçoando seu golpe, acumulando fortuna, vivendo em vilas com 23 quartos, enquanto autoridades de três países não conseguiam conectar os pontos. Ela era a startup do Vale do Silício da vigarice: crescimento exponencial, expansão internacional, modelo escalável, e quando finalmente deu errado, os sócios ficaram com a conta enquanto a CEO desapareceu.

E se ainda assim você pensar em acreditar, pergunte-se: se ela realmente pudesse ver o futuro, não teria previsto a própria prisão?

Ah, espera. Ela previu. Por isso está foragida.


Fonte: Kurir

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