Níltsá: as fabulosas forças que revivem o deserto

Níltsą́. Assim os Diné — o povo navajo — nomeiam a chuva. Mas para eles, não é apenas um fenômeno. É um espírito que caminha sobre a terra. Uma visita sagrada. Uma presença viva. A força imparável da Natureza, a força que alimenta o chão com a preciosa água, a força que permite que a vida floresça. A força que envolve todos nós.

Dizem que, quando a chuva se aproxima, Níłtsą́ avisa aos ventos. Eles, por sua vez, varrem os desertos, despertam as areias, fazem as folhas dançarem, como se tudo respirasse diferente. O céu muda de tom. As nuvens se acumulam como montanhas em movimento. O ar se torna mais denso, carregado de expectativa. É o prenúncio de algo maior.

Durante os ciclos de 2021 e 2022, no coração do Arizona, as monções desceram com uma força rara. A cada temporada, o céu parecia contar uma nova história. Algumas com relâmpagos rasgando o firmamento como raízes de luz. Outras com o sol se pondo em meio a nuvens douradas, como se o próprio dia hesitasse em partir. Havia tempestades que nasciam pequenas no horizonte e, em questão de minutos, dominavam tudo à frente. Também havia aquelas silenciosas, que surgiam sem aviso, como sussurros da terra para o céu.

A cada rajada de vento, a paisagem se transformava. Paredes de poeira se erguiam como muralhas de outro mundo. As nuvens, ora suaves, ora furiosas, se moviam em harmonia com a luz. Não havia dois momentos iguais. A natureza dançava sozinha, mas para quem soubesse observar, havia um ritmo, uma melodia oculta, feita de silêncio, trovão e tempo.

Os minutos finais deste registro guardam a memória de uma tempestade que parecia saída dos mitos antigos — tão intensa, tão bela, que desafia o olhar. É essa cena que estampa o rosto deste vídeo, não por acaso. Foi o ponto mais alto de um longo ciclo de esperas e contemplações.

Este não é apenas um registro do tempo. É um testemunho daquilo que escapa às palavras, mas que pode ser sentido com a alma. Porque Níłtsą́ não se vê apenas com os olhos. Ela se sente nos ossos, no cheiro do chão molhado, no som que vem de longe, no arrepio que antecede o primeiro raio.

E por alguns minutos, essa presença pode ser tocada. Reverenciada.

Como fazem os antigos. Como faz a terra.

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