Adoro definições. Vamos começar com algumas, antes de chegar ao prato principal. Dendrímeros são sistemas nanoscópicos com propriedades biomiméticas de proteínas globulares. Traduzindo para pessoas normais, dendrímeros são polímeros (ou, de uma forma mais leiga, plásticos) de tamanho bem, bem, beeeeeeeeeem reduzido, que podem ter estruturas semelhantes aos das proteínas (que são outros tipos de polímeros). Estes dendrímeros possuem muitas ramificações, mas acabam com uma aparência circular, de bolha, em outras palavras; daí o termo “globular”.
Muito interessante. E daí? Daí que vamos fazer “vai-e-vem” (não é este vai-e-vem, seus pervertidos) para explicar onde quero chegar, pois o tema é interessante e tem a ver com petróleo, plásticos, a mãe (Natureza) e o diabo a quatro.
No início era a pedra lascada. Depois, o homem resolveu fazer machados e usá-los para derrubar árvores, caçar e matar seus companheiros mais chatos. Com o tempo, ele começou a trabalhar com madeira, descobriu as ligas metálicas, como o bronze e o aço até chegarmos na Idade Contemporânea e aprendermos a usar o petróleo.
Do petróleo obtemos muita coisa, como vocês devem saber, como gasolina, pesticidas e plásticos.
A invenção dos polímeros sintéticos (doravante chamados de “plásticos” com todas as suas variadas propriedades físico-químicas), no início do século XIX provocou muitas mudanças na nossa civilização; o problema é que não há aspectos bons em algo somente. Sempre existe alguma coisa que seja ruim. A poluição ambiental é uma delas.
Plásticos, em sua maioria, não são biodegradáveis, ou seja, a Natureza não se livra deles com facilidade. Existe até uma piadinha sarcástica de um amigo meu que é biólogo que diz que estes plásticos são realmente biodegradáveis, pois degradam qualquer bio (piadas de nerds são engraçadas só para nerds, mesmo). Em contraposição, suas peculiaridades fazem deles uma alternativa viável, já que o mundo não possui tantos recursos naturais quanto fazem crer. Apesar de tudo, o petróleo não é eterno (shhh, não avisem isso aos nossos amigos do Oriente Médio) e a matéria-prima dos plásticos se esgotará um dia.
Dessa forma, há uma corrida para se encontrar um composto que concorra de igual para igual com o plástico, mas que seja ecologicamente aceito. Dizer que ele deve ser “verde”, pra mim, significa que deveríamos pintá-lo, de preferência com uma tinta à base de chumbo.
Ótimo, mas o que isso tem a ver com dendrímeros? Nada não. Eu puxei o assunto por falta do que fazer… Duh! Claro que tem tudo. E é isso que os cientistas japoneses estão pesquisando.
Com certeza, o elemento mais abundante na crosta terrestre é o silício, que existe sob a sua forma de com seu número de oxidação máximo: +4. Se você esqueceu-se das aulas de Química, os compostos tendem a existir sob a sua forma mais estável. Pois é, a Entropia foi mandada pro inferno mais uma vez, já que ela nunca foi “desorganização”. A forma mais estável do silício é quando ele compartilha 4 elétrons, pois ele tem 4 elétrons na última camada, a chamada “camada de valência”. Assim, ele está ligado a outro elemento abundante: o oxigênio e, portanto, temos a sílica, nome vulgar do dióxido de silício, SiO2.
Com tanta sílica dando mole por aí, nada mais natural que se pesquise um uso para ela. Antes, deram um emprego muito bonito, que continua sendo usado até hoje: o vidro.
Podemos encontrar sílica tanto em forma de cristais relativamente grandes, como a areia e quartzo, como em formas finamente divididas, com uma granulometria ínfima, a qual denominamos “argila” (barro, para leigos).
O que os cientistas pesquisam é uma forma de criarem um hidrogel, uma suspensão gelatinosa à base de água e uma mistura de compostos orgânicos (não necessariamente polímeros), de modo que consiga desempenhar as mesmas funções como o plástico, mas de uma forma que não agrida ao ambiente.
Até agora, os hidrogéis eram molengas e não possuíam tenacidade (resistência à tração), de modo que não podiam ser usados em estruturas; mas com a adição da argila, as propriedades físicas mudam e tornam o composto mais versátil.
A argila, então, combina-se com o hidrogel cadeias dendríticas, formando uma armação rígida que apóia a outras moléculas, e cria material sólido. Além disso, porque o material é formado principalmente por água e argila, com apenas um pouco de polímero, o material não tem nenhuma das qualidades tóxicas de plástico.
Meio complicado? Vamos destrinchar isso melhor: o plástico a ser usado para se fazer uma suspensão em água. Assim, ele fica lá dissolvido, com propriedades de uma solução coloidal chamada gel (parecido com uma gelatina). A adição de argila faz com que apareçam cadeias de moléculas que agem como “amarras”, como se você colocasse uma caixa dentro de um caminhão, colocasse alças em cada face dessa caixa e amarrasse estas alças em cada parede do caminhão. Por mais que o veículo ande e sacuda, as amarras segurarão a caixa, de modo que ela não deslize de um lado pro outro, dando-lhe resistência ao movimento. Quanto mais amarras, maior a segurança e maior a resistência mecânica em contraposição ao movimento.
Outra aplicação destes materiais seria para a produção de próteses, já que alguns plásticos não são inteiramente compatíveis com o sangue e seus componentes. No entanto, com biomateriais seria mais fácil esta aceitação pelo organismo.
O artigo foi publicado na revista Nature, onde é descrito como os pesquisadores obtiveram este material e suas aplicações. Ainda é meio caro produzir hidrogéis assim, mas com a produção em massa, a tendência é baratear o processo, diminuindo o impacto ambiental dos outros tipos de plásticos, pois estes últimos seriam gradativamente substituídos pela sua alternativa mais ecológica.
Fonte: Ars Technica
