Cérebro trata ferramentas como partes do corpo

Em qualquer aula decente de artes marciais (não aquelas besteiras de Jiu-Jitso, onde ficam monte de homem se agarrando, Ui!), os alunos são ensinados a tratar as armas como extensões do seu próprio corpo, se bem que Chuck Norris faz de suas mãos armas letais, como uma serra elétrica ou uma britadeira. Obviamente, isso é uma mera metáfora dos velhinhos de olhos puxados, certo? Pelo visto, eles sabiam das coisas, já que pesquisas revelam que nossa gambiarra evolutiva que temos dentro da cabeça chamada “cérebro” processa instrumentos diversos – desde um martelo até uma escova de dentes – como se fosse um prolongamento de nosso corpo. Sim, eu sei o que você está pensando, mas deixe pra ir na sex-shop depois de ler o artigo.

Segundo alguns psicólogos (um pessoal estranho que acha que faz ciência dizendo o quanto você está errado ao não ter xingado o seu chefe, interiorizando sua agressividade), nossos cérebros criam uma representação mental de nossos corpos – o chamado “esquema corporal” – que nos permite coordenar as nossas várias partes e para interagir com o mundo que nos rodeia. Agora, Lucilla Cardinali (não, ela não é parente da Claudia) do Institut national de la santé et de la recherche médicaleINSERM (Instituto Nacional de Saúde e da Pesquisa Médica), que fica na França, constatou que nós incorporamos ferramentas para este plano mental, após usá-las para apenas alguns minutos. É a confirmação de uma ideia que vem sendo empurrada com a barriga por quase um século.

Em artigo publicado na Current Biology, a bela Lucilla descreve a pesquisa, onde recrutou 14 voluntários e pediu-lhes para agarrar um bloco no meio de uma tabela, que estava sempre à mesma distância. Então, eles tiveram que repetir as mesmas ações com uma espécie de “agarrador” (conforme foto na abertura do artigo) e depois uma terceira vez, com suas próprias mãos novamente.

Pequenos LEDs nas mãos dos voluntários permitiram à Lucilla monitorar os movimentos e calcular a velocidade e a aceleração dos braços de cada voluntário. Ela descobriu que eles chegaram para o bloco de maneira diferente depois de terem sido acostumados ao agarrador, demorando mais tempo para usar as suas mãos e de forma mais lenta. Os atrasos ainda afetaram a velocidade ao pegar no bloco, um comportamento que não tinha sido “treinado” com o agarrador.

Para Cardinali, estes resultados sugerem que, após usar o agarrador, os voluntários tinham incluído em sua representação mental o uso dele como se fossem pares de seus próprios corpos. Por isso, eles sentiram que seus braços eram mais lentos ao pegar o bloco, sem o uso da ferramenta.

Antes de aceitar esta interpretação, Cardinali teve de excluir a possibilidade de que eles estavam simplesmente um pouco mais cansados na segunda sessão. Para fazer isso, ela repetiu a experiência com outro grupo de voluntários que utilizaram um agarrador enquanto seus punhos foram forçados para baixo com pesos de 300 gramas. Apesar da carga extra, este grupo de voluntários mostraram as mesmas alterações que o grupo anterior que utilizou a ferramenta mais leve – claramente, a sua demora não foi afetada pelo peso do aparelho, mas o fato de ter sido utilizada em primeiro lugar.

Mas a mais clara evidência de Cardinali na teoria veio de um experimento final, quando ela tocou os voluntários em seus punhos, cotovelos ou dedos médio e pediu-lhes que utilizassem seus dedos indicadores da outra mão para apontar diretamente acima do ponto de contato. Este simples pedido revelou que após usar o agarrador, os voluntários sobreavaliou o comprimento do seu braço, isto é, eles instintivamente achavam que tinham braços maiores. Seus dedos apontaram uma distância maior entre os seus dedos médio e o cotovelo, ou entre os seus punhos e cotovelos, do que quando fizeram antes de terem usado a ferramenta.

Estes estudos mostram que os nossos cérebros são rápidos a atualizar o nosso corpo. Esta capacidade de tratar rapidamente ferramentas como sendo partes de nosso próprio corpo, sem falar que demonstra que pode ocorrer uma rápida adaptação de pessoas mutiladas com próteses, de modo a considerá-las partes genuínas de seus corpos, facilitando sua locomoção e interação com oambiente.

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