O medo é algo intrínseco a todos os seres vivos com um sistema nervoso decente. Quando aplicado em larga escala, o medo acaba virando paranoia. Paranoia em larga escala pode acarretar em coisas lindas como perseguição, ódio e guerra (além de achar que todas as mulheres de seu trabalho estão tendo um caso com você). Qualquer foco do medo, junto a agitação política, não tem bons históricos de finais felizes. E isso é o que parece se desenhar na Holanda, onde nesta sexta-feira foi promulgada uma lei proibindo terminantemente o uso das burcas, niqabs e outras vestimentas características das mulheres muçulmanas.

A Holanda parece estar esquecendo-se de sua História. Onde antes o país era a junção do que havia de melhor em termos de tolerância e o que seria um verdadeiro shopping center da Idade Moderna, onde todos iam para lá para saber das novidades do mundo e os comerciantes holandeses era os novos/antigos mercadores, que traziam todas as novidades do mundo que podiam ser comercializadas, concorrendo com outros países pelo que viria a ser o Capitalismo moderno (na verdade, o Capitalismo existe desde que o mundo é mundo, mas estou me dispersando).

Sendo um grande centro comercial, a Holanda recebia visitantes de todas as partes do mundo, de diversas culturas. Isso, porém, parece que será enterrado no passado. A paranoia crescente, disseminada por políticos radicais como Geert Wilders, acaba fazendo com que a Holanda crie leis que em princípio afetam a individualidade das pessoas. Nesta semana, foi aprovada uma lei (inicialmente proposta pelo próprio Wilders, em 2005) que proíbe terminantemente o uso de burcas, niqabs e véus muçulmanos que cubram o rosto em locais públicos. Wilders alega que o véu islâmico possui ampla relação com o terrorismo (não me perguntem que merda de associação de ideias é esta), mas na redação final — na base do morde/assopra — o motivo ficou descrito como sendo que as burcas "não se encaixam em nossa sociedade aberta e as mulheres devem participar plenamente", de acordo com o Primeiro Ministro Jan Peter Balkenende, do partido Christen-Democratisch Appèl (eu sempre achei o termo cristão-democrata algo meio esquisito de se ouvir dado seu histórico, mas não posso achar que todos os cristãos são cristãos de verdade como os que mandam executar quem não concorda com eles).

Muito bem, o primeiro ministro acha ainda que qualquer traje que esconda parcial ou totalmente o rosto é uma afronta à vida pública, onde as pessoas são justamente reconhecidas por seus rostos. Isso nos faz pensar nos cidadãos abaixo:

Como podem ver, eles escondem o rosto e devem ser obrigados a pagar multa, que no caso da Holanda seria pouco mais de 900 reais, pela cotação de hoje. Em contrapartida, não há nada demais no carnaval holandês, em que crianças e senhoras idosas podem assistir tranquilamente, sem que se sintam ofendidos.

A verdade é que a paranoia islamofóbica está chegando ao ápice da estupidez e tudo em prol da "liberdade", só que este filme já vimos antes e o senador Joseph McCarthy não me deixa mentir.

Não será a burca ou um boné de rapper que faz alguém ser um maníaco homicida. Muitos eram tidos como pessoas aparentemente normais, como certos noruegueses. Que a França tenha editado uma lei assim, é entendível, já que eles são abertamente xenófobos, ainda mais se levarmos em consideração que todo mundo colocou a França de joelhos, onde a piadinha corrente é que a bandeira deles não precisava ter 3 cores já que normalmente eles só usam uma delas.

A cidade de Maaseik, da Bélgica – que não dista muito da fronteira com a Holanda – já tem uma lei contra o uso dos véus islâmicos, sob alegação que crianças choravam ao  mulheres de burcas na rua. Bem, eu já vi criança chorando ao ver Papai Noel, so what? Mas parece que mulheres em longas vestes negras colocam medo no coração das pessoas. Sugiro a extinção de conventos, também e pena de morte para freiras que saiam à rua usando hábitos, mas acho um pouco difícil disso ocorrer.

O que estão promovendo é dar mais motivo para levantes e protestos, onde usarão a burca como símbolo de liberdade religiosa e diretos civis. Não é o uso da burca que fará as mulheres inferiores aos homens. Não é a burca que faz as mulheres terem salários inferiores aos homens e nem é o motivo pelo qual o Brasil precisa ter cotas de cadeiras no Legislativo reservadas para mulheres (e mesmo assim não são preenchidas, pois as próprias mulheres não votam em mulheres). Se os idiotas se preocupassem em cuidar melhor de seus países ao invés de se preocupar com me merda de roupa a pessoa sai à rua, as coisas ficariam mais fáceis. Depois, há a reclamação do ódio que os povos tiranizados têm contra eles, gerando outra lei imbecil cerceando mais direitos, os quais aumentarão o ódio.

Fonte: O Globo