Se dependesse da boca, macacada poderia falar. Por que não o faz?

Nossa fala é mais que articular palavras. É um processo neurológico. Entretanto, não adianta ter o software de controle sem o hardware que será controlado. É preciso ter lábios, mandíbula e língua capazes de propiciar que os sons sejam articulados. Ainda assim, tem uns probleminhas, já que macacos possuem estes órgãos bem semelhantes a humanos. Ainda assim, macacos não falam (no conceito humano, já que eles possuem comunicação própria). Entrou aí a teoria da “laringe descendente”.

Tudo começou em 26 de junho de 1931, quando o psicólogo Winthrop Niles Kellogg e sua esposa acolheram em casa um bebê chimpanzé. O casal planejava criar Gua (o chimp) como um bebê, ao lado de Donald; não o pato, mas o filho do casal. A ideia era saber se seria possível que um chimpanzé criado como um humano se comportaria como um humano, sendo até mesmo capaz de falar. A pesquisa foi publicada no periódico The Psychological Record, e foi um fiasco.

Este experimento foi repetido outras vezes. Nada! Não importa quantas vezes tentassem, criar chimpanzés como uma criança não resultava num comportamento similar. Em 1969, Philip Lieberman, um cientista cognitivo, propôs a teoria da laringe descendente. Ao comparar o trato vocal humano com os macacos, Lieberman mostrou que macacos possuem uma pequena faringe, relacionada à alta posição de sua laringe, enquanto nos humanos a laringe é menor. Esse bloqueio anatômico, a princípio, impediria a produção de vogais diferenciadas, presente em todas as línguas do mundo e necessária para a linguagem falada.

Esta teoria foi aceita pela maioria dos primatologistas. Mas não, não é bem assim. Pesquisas apontam que não são só os humanos que apresentam a chamada “laringe descendente”.

Agora, uma outra pesquisa resolveu estudar como macacos produzem seus sonos. O que foi descoberto é que chimpanzés conseguem produzir proto-vogais bem diferenciadas, evidenciando que a produção de vocalizações diferenciadas não é, dessa forma, uma questão de variantes anatômicas, mas de controle dos órgãos articuladores.

O dr. Louis-Jean Boë é pesquisador do Departamento de Fala e Cognição da Universidade de Grenoble. Ele estuda como se dão os processos de cognição na hora de estruturar a fala e a comunicação oriunda desses processos.

Boë e seus colaboradores conseguiram demonstrar que a macacada consegue empregar um sistema de proto-vogais, levando em conta as cavidades acústicas formadas pela língua, mandíbula e lábios, que são bem semelhantes aos dos seres humanos. A pesquisa demonstrou que a produção de vocalizações diferenciadas não é uma questão de anatomia, mas de controle dos órgãos, daí vem a parte da cognição, e macacos não são lá que nem os seres humanos. Ok, alguns macacos são melhores, mas isso não implica que eles tenham software capaz de recitar um poema.

A comparação foi feita com trato vocal de babuínos e humanos modernos. Há ali os mesmos articuladores, com músculos, ossos e cartilagens semelhantes aos dos humanos, mas em humanos a laringe é menor, aumentando o tamanho relativo da faringe em relação à boca.

A análise acústica das vocalizações de macacos mostra que, apesar dessa diferença anatômica, eles podem produzir as tais proto-vogais diferenciadas.

Quer mais detalhes? Que tal ler o artigo publicado no periódico Science Advances? Tá abertinho esperando você chegar junto.

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