
O simples homem olha para os seus oponentes. Eles eram maioria. Selvagens, belicosos, violentos, com sede de sangue e malevolência nos olhos. Os assaltantes estavam em número de 40 e se preparavam para o massacre, eles não deram conta, pois, eles não tinham como prever o futuro. O homem ergueu seus olhos castanhos e sabia o que viria. Seria uma catástrofe, um morticínio, uma violência exacerbada, com sangue espirrando por todos os cantos. O ambiente claustrofóbico do trem vaticinava o que haveria dali a instantes e a contagem 40 para um era um crime perante os olhos de pessoas que são contra injustiças. 40 bandidos estavam prontos para avançar. A chacina teria início, e o certo a ser afirmado é que seria aquela luta seria injusta. Eles deviam ter chamado mais 40.
O homem à frente deles era um gurkha.
Quando as pessoas falam de grandes guerreiros, elas pensam nos hoplitas gregos, nos cavaleiros de Alexandre da Macedônia, nos legionários romanos, nos Imortais do Império Persa, nos samurais japoneses, no SAS britânico e nos boinas verdes americanos. Eu penso nos gurkhas.
Em todos os teatros de guerra do mundo, ninguém é mais eficiente, corajoso, destemido, feroz, implacável e leal que os gurkhas. Eles não são apenas soldados. São símbolos vivos de destemor, honra e habilidade. Originários das montanhas do Himalaia no Nepal, seus exércitos foram incorporados às forças britânicas em 1814. Desde sempre, gurkhas têm sido reverenciados como exemplares da bravura humana, construindo uma história que mistura lenda e realidade, marcada por feitos heroicos e dedicação inabalável. Sua arma característica, o khukuri ou kukri, uma lâmina curva tão eficaz e mortal quanto simbólica, é a extensão de sua alma guerreira, que já fez mais vítimas que muitos canhões. Um khukuri na mão de um gurkha é uma arma de destruição em massa.

A aliança entre os gurkhas e o Império Britânico nasceu durante a guerra anglo-nepalesa (1814-1816). Apesar de enfrentarem um inimigo mais bem equipado e numericamente superior, os gurkhas impressionaram os britânicos com sua resiliência e astúcia. Espantados com o que assistiram em campo de batalha, o pessoal do Império Que o Sol Nunca se Põe apelou para o adágio “é melhor tê-los como amigos do que como inimigos”, e os comandantes britânicos ofereceram-lhes um lugar em seu exército.
Durante o século XIX, os gurkhas consolidaram sua posição como uma força indispensável ao Exército de Sua Majestade, participando de campanhas em regiões como a Índia, o Afeganistão e a Malásia. Sua fama cresceu exponencialmente, e com ela, o temor que inspiravam em seus inimigos. No início do século XX, já eram considerados uma das tropas de elite mais temidas do mundo, reconhecimento que só aumentaria durante as Guerras Mundiais.
Na Primeira Guerra Mundial, mais de 100 mil gurkhas lutaram em frentes que iam da França ao Oriente Médio. Eles enfrentaram trincheiras lamacentas e ataques químicos com uma determinação sobre-humana, tornando-se símbolos de resistência. Na Segunda Guerra Mundial, o número cresceu para mais de 112 mil soldados, que atuaram em cenários tão diversos quanto a selva da Birmânia e o deserto do Norte da África. Relatos da época destacam sua habilidade em combates corpo a corpo e a disciplina que os tornava praticamente invencíveis, instilando terror no coração da Waffen-SS. Durante a campanha na Itália, por exemplo, um pelotão gurkha conseguiu tomar posições inimigas consideradas impenetráveis, solidificando ainda mais sua lenda.
Eram impenetráveis, mesmo. Para soldados comuns. Gurkhas não são soldados comuns, e alemães e italianos aprenderam isso sob o fio das lâminas afiadíssimas das khukuris gurhas.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial e a independência da Índia em 1947, os regimentos gurkhas foram divididos: seis foram incorporados ao recém-criado Exército Indiano, enquanto quatro permaneceram sob o comando britânico. Esses últimos continuaram a servir nas colônias asiáticas restantes, especialmente em Hong Kong, onde desempenharam um papel crucial na segurança do território até sua devolução à China em 1997. Esse período marcou um ponto de transição, mas os gurkhas mantiveram sua relevância.
Em março de 1982, uma força naval argentina partiu de Porto Belgrano rumo às então chamadas ilhas Malvinas sob o pretexto de exercícios militares, mas com a missão real de retomar o arquipélago sob controle britânico. Alertado pela Serviço Secreto de Informações, o governador britânico Rex Hunt preparou a defesa local, desativando o aeroporto e os radares. Na noite de 1º de abril, 92 mergulhadores argentinos, liderados pelo capitão de corveta Guillermo Sánchez-Sabarots, desembarcaram na costa das ilhas, enquanto o submarino Santa Fé emergiu para apoiar a operação, sendo detectado e iniciando as primeiras hostilidades.
Nas primeiras horas de 2 de abril, os argentinos lançaram ataques em duas frentes: um grupo avançou para o acampamento britânico de Moody Brook, enquanto outro se dirigiu ao Palácio do Governador. Apesar da resistência britânica, as forças argentinas conseguiram avançar e consolidar o controle do arquipélago. No dia 3 de abril, a bandeira argentina tremulava sobre as ilhas, mas as forças que navegam sob a bandeira de São Jorge não iam entregar de mão beijada. Começara a Guerra das Malvinas.
A então Primeira-Ministra britânica Margareth Thatcher ficou possessa. As tropas começaram a se mover. Foi então que em 1° de junho de 1982, 5.000 homens da 5ª Brigada de Infantaria foram mobilizados. Dessa Brigada fazia parte 1º Batalhão 7º Duque de Edimburgo; eram fuzileiros gurkhas. Daria até pena dos argentinos, mas eles desceram pro play primeiro. Só a presença de gurkhas fez os argentinos verem que estavam bem ferrados. Hoje, as Malvinas se chamam Falklands, e isso graças aos guerreiros nepaleses.
Mas as glórias e reconhecimento dos gurkhas como os mais temidos soldados não se dissiparam com o passar do tempo, e a isso alguns pobres coitados muito azarados podem corroborar.
Em 2 de setembro de 2010, o senhor Bishnu Prasad Shrestha estava voltando para casa no trem Maurya Express de Ranchi para Gorakhpur após uma aposentadoria voluntária do Exército Indiano, mas aconteceu um problema. Por volta da meia-noite, 40 bandidos armados invadiram o trem; este foi o primeiro erro deles. Os criminosos começaram a saquear os passageiros, e o senhor Shrestha manteve a calma e se permitiu ser roubado pelos ladrões armados até os dentes com facas, facões e armas de fogo; este foi o segundo erro deles.
Então, eles cometeram mais um erro: os vagabundos começaram a mexer com uma garota de 18 anos na frente de seus pais, que estavam assistindo impotentes. A menina ia ser estuprada por todos ali; sua irmã gritou por socorro e pediu ajuda ao senhor Shrestha. E este foi o último erro dos malfeitores.
O senhor Bishnu Prasad Shrestha estava lotado no 7º Batalhão do Exército Indiano, no 8º Regimento de fuzileiros.
Fuzileiros gurkhas.
O soldado Shrestha, o guerreiro imortal, sacou da sua amiga que sempre o acompanhou em batalhas e lutou contra todo o grupo de 40 ladrões sozinho, matando três deles e ferindo outros oito. Os bandidos conseguiram tomar a kukhuri de Shrestha, mas isso não o impediu, só o deixou mais raivoso, porque aqueles bandidos tocaram na sua arma e isso não é coisa que um guerreiro faça! Os bandidos tentaram atirar em Shrestha, mas os coitados nunca viram o que era um gurkha com raiva. Alguns tiveram o desprazer disso e foi a última coisa que viram. Os outros passageiros ajudaram a enfrentar os ladrões, mas a maioria dos covardes escaparam. Mas não sem nosso herói ter se ferido. Ele cortou a mão.

Quando a família da quase vítima de estupro lhe ofereceu uma grande recompensa em dinheiro, o soldado Shrestha ostentou seu orgulho e dignidade recusando a oferta, dizendo: “Lutar contra o inimigo em batalha é meu dever como soldado. Enfrentar os bandidos no trem era meu dever como ser humano”.
O soldado Bishnu Prasad Shrestha, do 7º Batalhão do Exército Indiano, 8º Regimento de Fuzileiros Gurkhas, manteve-se fiel às tradições de seu regimento e treinamento gurkha. Por seu feito, foi-lhe concedida pelo governo indiano a Medalha Sena, por atos individuais de excepcional devoção ao dever ou coragem que tenham um significado especial para o Exército.
Este é o espírito dos mais temidos e leais guerreiros do mundo.


Por um segundo eu pensei que tu disse dizer que “Ele quebrou uma unha”… :D
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Que FODA!
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