Pato quadrúpede demonstra Evolução da espécie

O patinho britânico Stumpy, além de ter virado celebridade no mundo todo durante a semana que passou, está em muito boa companhia. Com suas quatro patas totalmente funcionais, Stumpy acaba de se juntar a uma estirpe das mais nobres, a dos vertebrados com mais de quatro membros. Criaturas de pedigree elevadíssimo e reputação literalmente lendária fazem companhia à pequena ave, como as muitas variedades de dragões alados (bichos de seis membros, igualzinho a Stumpy) ou Sleipnir, o cavalo de oito patas do deus escandinavo Odin. É muita moral para um patinho da roça.

Estranhou a associação, estimado leitor? Pois faz muito bem. O esquisito na trinca Stumpy/dragões alados/Sleipnir é que só o patinho-celebridade (infelizmente, na minha opinião de apaixonado por mitologia) existe no mundo real. Por alguma razão, a natureza não é muito chegada em vertebrados terrestres com mais de quatro membros.

A parte legal, no entanto, é que as patinhas extras do pato estão longe de ser mera aberração. Elas são a ilustração perfeita de um princípio para lá de comum na evolução dos animais, responsável, entre outras coisas, pela existência da nossa coluna vertebral ou da variedade acachapante de insetos que rastejam, saltitam ou voam por aí. E nem é tão difícil entender o porquê.

Para tanto, comecemos com uma das minhas analogias favoritas: em certo sentido, o corpo humano e o da maioria dos outros animais vivos hoje funciona como aquelas famosas pecinhas de Lego. (Explicação rápida para quem não teve infância: as peças de Lego, um típico brinquedo “educativo”, costumam ter tamanhos e formas padronizadas, mas permitem montar toda sorte de objetos, de casinhas a submarinos.)

O termo técnico para objetos que apresentam essa “leguice” (que belo neologismo, hein?) é modularidade. Objetos modulares, embora apresentem grande variedade de forma em seu conjunto, são formados pela repetição, às vezes um pouquinho modificada, de unidades básicas.

A modularidade é provavelmente o segredo por trás da variedade de formas e adaptações que caracterizam o reino animal. E só pensar nos artrópodes, o grupo de invertebrados que responde pela imensa maioria das espécies vivas hoje e engloba principalmente insetos, crustáceos, aranhas e escorpiões. Se você já viu um camarão com casca, sabe que o corpo do bicho (assim como o de toda a parentada citada acima) é dividido em segmentos – pequenos anéis que aparecem claramente como vincos na casca da futura guloseima.

Dividir seu corpo em segmentos abre as porteiras para a evolução da forma por dois motivos. O primeiro é que não é preciso nenhuma modificação genética radical para que o número de segmentos cresça ou diminua. Não é muito difícil que um bicho mais curto dê origem a outro mais comprido, ou vice-versa.

Em segundo lugar, a segmentação também pode ajudar a criar redundância. Imagine uma criatura com um número reduzido de segmentos. Todos eles são usados para funções completamente essenciais do organismo – comer, defecar e se mexer, digamos. Se por algum motivo esse bicho gera um descendente com segmentos extras, é bem possível que as partes sobressalentes não sejam um fardo muito grande e, de quebra, fiquem disponíveis para o uso em novas funções – desenvolver uma antena, ou um ferrão, por exemplo.

Tanto é assim que estruturas maravilhosamente complicadas, como as pinças de uma lagosta, são claramente modificações de coisas mais simples que existiam quando havia pouca especialização de segmentos. O mesmo vale para a nossa coluna vertebral – as vértebras, embora com uma origem comum, são modificadas de forma específica se você é um primata ou uma cobra – e para o comprimento e a conformação dos dedos, cinco entre humanos, apenas um em cavalos.

Com esses requisitos mínimos dá para fazer maravilhas, acredite. A prova mais cabal desse fato é que a imensa maioria dos animais usa o mesmo “kit de ferramentas” genético para gerar, durante a formação do embrião, toda a diversidade que se vê mundo afora. Os principais pedaços desse kit são conhecidos como genes Hox, e as mesmíssimas famílias deles estão presentes tanto numa mosca-das-frutas quanto em todos nós.

A elegância dos genes Hox é que eles não especificam exatamente o que é “construído” pelo montador de Lego chamado desenvolvimento embriológico, mas sim onde cada coisa é construída. Pense numa série de setinhas, que indicam coisas como: “segmento do tipo X até aqui”; “insira aqui um par de pernas”; “insira aqui um olho”. Trata-se de um sistema para especificar informações posicionais dentro dos módulos, quase um GPS genético.

Meu exemplo favorito é um gene que não é exatamente Hox, mas tem parentesco com o grupo. Seu nome é ey, e ele coordena a formação de olhos em moscas-das-frutas. O olho dos insetos, multifacetado, não tem aparentemente nada a ver com o nosso olho em câmara dos vertebrados. Muita gente costumava assumir que eles evoluíram de forma totalmente independente. No entanto, o que acontece quando se insere um gene ey num embrião de camundongo? Ele leva à produção de olhos – não de mosca, mas de camundongo. Os mamíferos possuem sua própria versão do ey, chamado Pax6. Ele claramente se originou do mesmo gene ancestral do ey.

Voltemos ao nosso patinho. Ninguém fez uma análise genética do bicho ainda, até onde foi divulgado, mas me parece muito razoável apostar que alguma bagunça aconteceu no sistema Hox do bicho quando ele ainda estava dentro do ovo. Por algum motivo, a informação “construa aqui um par de patas” foi duplicada, e o resultado foi Stumpy, com seu par de “estabilizadores” (como definiu o fazendeiro que o cria), além das patas normais. A idéia é menos maluca do que parece: nas boas e velhas moscas-das-frutas, as confusões afetando genes Hox levam, por exemplo, ao surgimento de antenas na cabeça, ou de pares extras de asas.

A grande pergunta é: por que Stumpy, apesar de ter se formado com a ajuda de regras genéticas comuns a boa parte do reino animal, é uma exceção? Vamos descontar as afirmações do fazendeiro que o cria, segundo o qual o bichinho é saudável e não tem problemas por causa das patinhas a mais. Pode até ser que o patinho consiga se reproduzir, mas a ausência completa de qualquer espécie de vertebrado com mais de quatro membros provavelmente quer dizer alguma coisa.

E o que seria? Eis o mistério, e aparentemente ainda estamos longe de ter uma resposta específica a essa pergunta. Em linhas gerais, porém, parece que cada linhagem de seres vivos tem suas próprias possibilidades e limitações evolutivas – algo como uma fronteira dentro da qual ela pode se mover, mas além da qual ela não pode ir. Ao contrário dos artrópodes, quatro patas (vá lá, modificadas, encurtadas ou encompridadas, ou até transformadas em asas) é o limite da viabilidade para nós, vertebrados terrestres. Admito que talvez seja uma pena – nós provavelmente nunca vamos cavalgar um dragão alado. Mas um dragão-de-komodo já é sensacional o suficiente.

Fonte: G1

4 comentários em “Pato quadrúpede demonstra Evolução da espécie

  1. Não que tipo de “evolução” pato demonstra, vejo somente um erro de programa, ele continua sendo pato, foi gerado de um casal de patos, resta analisar sua escendência. Qual o motivo de classificar tal ocorrência com evolução. Acho que os biologos deveriam ter mais humildade e admitir que não sabem o que originou a vida(assim como Isaac Newton declarou que não sabia o motivo da existência da gravitação iniver e o Gödel admitiu que por mais perfeita que seja a matemática podem existir suposições que causam idecidíveis), e ainda chamam a evolução de fato.

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  2. E vc devia estudar mais, afim de aprender que Evolução explica a origem e variedade das espécies e não a origem da vida.

    Dããããããããaã

    O que vc acha que é ou não torna-se, portanto, irrelevante.

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  3. Gostei do explanado acima, revela acima de tudo a observação de um fato no mínimo curioso: Não existem animais vertebrados com mais de 4 membros. Desde Dinossauros até a nossa atual cadeia de vertebrados, eu particurlamente não conheço nenhum animal vertebrado de 6 membros. Basicamente, iniciei uma busca de informações a respeito quando me questionei se era possível geneticamente um vertebrado de 6 membros. Até acredito que seja possível, mas não sei o que é necessário para que isso ocorra. Diga-se de passagem que um sonho antigo da humanidade é o de ser capaz de voar, mas com recursos do próprio corpo, ou seja, o homem deseja ser alado. E para tal (deixando de lado aqui a questão ética), a primeira coisa necessária seria desenvolver um ser com 6 membros funcionais, e imagino que isto envolve além da questão estrutural, um remapeamento cerebral para que o mesmo seja capaz de manipular este novo membro. Diga-se de passagem, as imagens de vampiros alados estão mais próximas da realidade genetica do que a de anjos alados, pois no primeiro caso, imagina-se o 3º par de membros usando a pele como elemento que dá sustentação ao vôo, e sabemos que isso é perfeitamente possível nos morcegos. Idéias a parte, se um diar for possível ao ser humano mudar a sua composição genética ainda em vida (pois atualmente apenas os descendentes modificados genenticamente podem “desfrutar” da modificação) acredito que a forma alada com “asas de morcego” será a forma alada disponível aos seres humanos.

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