Brasil ganha duas novas espécies de lagarto

Por Reinaldo José Lopes

Os pequenos Stenocercus quinarius e Stenocercus squarrosus parecem dragões em miniatura, e provavelmente escondem uma história ainda mais antiga e misteriosa que os répteis da lenda. Os bichos pertencem a duas novas espécies de lagartos do interior do Brasil, que acabam de ser apresentadas formalmente aos cientistas e ao público.

A descrição das novas espécies está na revista científica “South American Journal of Herpetology” e foi feita por Cristiano Nogueira, analista de biodiversidade da ONG de pesquisa Conservação Internacional (CI), e Miguel Trefaut Rodrigues, zoólogo da USP. O S. quinarius (assim chamado por causa das cinco cristas salientes no seu corpo) vive na fronteira entre Minas Gerais e Bahia, tendo sido encontrado no Parque Nacional Grande Sertão Veredas. Já o S. squarrosus (nome que se refere às escamas “arrepiadas” de seu dorso) é piauiense e foi descoberto no Parque Nacional da Serra das Confusões.

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Até hoje só duas outras espécies do mesmo gênero foram achadas no Brasil, contou o pesquisador Cristiano Nogueira. Uma delas é do leste do Pará – uma região que possui várias manchas de cerrado. A outra é praticamente uma espécie-fantasma: só há um registro de sua ocorrência em Minas, feito por naturalistas no século 19. “São bichos muito pouco conhecidos e ainda mal estudados, e essa descoberta ajuda a preencher um dos buracos nessa história”, afirmou ele. O curioso é que quase todas as outras espécies do gênero – mais de 50 – vivem nos Andes, em regiões elevadas, de vegetação aberta.

Como, então, os bichos vieram parar no Brasil? A pista pode estar no habitat das novas espécies, os chamados carrascos. “Ninguém tem uma resposta certa para explicar o que são esses carrascos”, diz Nogueira. São áreas no alto de chapadas, cobertas por uma mistura de floresta seca e relativamente densa com uma savana mais aberta – quase uma mescla de cerrado e caatinga.

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A hipótese dos cientistas é que os carrascos representem os remanescentes de um tipo de vegetação que já foi muito mais comum na América do Sul, mas que foi encolhendo para manchas desconectadas na paisagem por causa de mudanças climáticas e no relevo. Por isso é que os parentes mais próximos dos novos lagartos estariam a milhares de quilômetros de distância, nos Andes e no leste do Pará.

Esse tipo de separação geográfica de populações é ideal para criar, ao longo do tempo, espécies novas. Por isso, muito provavelmente os novos bichos são endêmicos, ou seja, só existem nas pequenas manchas de carrascos, e em nenhum outro lugar. Isso também ressalta o risco que as novas espécies correm no exato momento em que “nascem” para a ciência: como todo o resto do cerrado, seu habitat sofre com o desmatamento, que alimenta as carvoarias e também o avanço da fronteira agrícola.

Senta-e-espera

Uma das maneiras de testar as idéias dos pesquisadores sobre a origem e a formação dos carrascos pode ser uma análise de DNA das várias espécies do gênero Stenocercus. Isso ajudaria a estimar o tempo de separação entre elas e, portanto, o momento em que elas ficaram isoladas umas das outras. Antes disso, porém, ainda é preciso aprender muito sobre o estilo de vida das novas espécies.

Segundo Nogueira, a couraça dos bichos ajuda tanto a protegê-los de predadores quanto a controlar sua temperatura, absorvendo e dispersando calor. Os dois não chegam a 15 cm de comprimento e são predadores do tipo senta-e-espera – ou seja, caçam usando tocaia. Comem principalmente insetos, como cupins e formigas.

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