Arqueologia no Espaço: Como velcro, cabos e gambiarras revelam os segredos da ISS

Se você já viu fotos do interior da Estação Espacial Internacional, provavelmente notou que aquilo ali não parece nem de longe com a ponte de comando da Enterprise. Nada de superfícies lisas, hologramas futuristas ou tripulação impecavelmente uniformizada desfilando por corredores minimalistas. A realidade é bem mais… digamos, intimista. Cabos pendurados por todo lado, equipamentos brotando das paredes como cogumelos metálicos, objetos flutuando em arranjos aparentemente caóticos. Não há chuveiro como o que você tem em casa, não há cozinha de verdade e não há sequer uma sala de estar onde a galera possa relaxar depois de um dia duro de ciência orbital.

É o futuro, sim, mas é o futuro que a humanidade conseguiu construir de fato, e que está prestes a completar 25 anos de ocupação ininterrupta. E o mais curioso: arqueólogos estão estudando esse lugar como quem escava ruínas antigas. Só que essas ruínas ainda estão habitadas e orbitando a 400 km de altura. Continuar lendo “Arqueologia no Espaço: Como velcro, cabos e gambiarras revelam os segredos da ISS”

Da Transilvânia para sua mesa: o Paprika Hendl de Drácula

Quando Bram Stoker escreveu Drácula em 1897, ele não apenas criou um dos personagens mais icônicos da literatura de terror, mas também registrou sabores e aromas de uma Europa Central que poucos conheciam, deitando sobre as páginas de seu romance gótico um pouco dessa cultura gastronômica.

Entre as brumas dos Cárpatos e os corredores sombrios do castelo do Conde, há um detalhe que muitos leitores deixam passar: a comida. E é justamente em uma dessas passagens que encontramos o Paprika Hendl (ou Paprikás Csirke, em húngaro), um prato que revela muito sobre o contexto histórico da obra. Continuar lendo “Da Transilvânia para sua mesa: o Paprika Hendl de Drácula”

A ópera-bufa do roubo ao Louvre

O homem audacioso passou muito tempo planejando. Aquele era o momento e ele está de pé, ali, de frente para o local de seu crime. A fachada do palácio se estende imponente sob o céu cinzento, suas alas simétricas de calcário já manchadas por séculos de chuva parisiense. Colunas coríntias subiam em fileiras solenes, frontões barrocos coroavam pavilhões como coroas esquecidas de reis mortos, e estátuas de deuses greco-romanos observavam o pátio vazio de paralelepípedos irregulares com olhos de mármore indiferente. Eram deuses, por que iriam se importar com as paixões humanas? Os telhados de ardósia negra desenham silhuetas dramáticas contra as nuvens, enquanto janelas altíssimas refletiam o céu como espelhos cegos. Nada quebrava a geometria clássica, nenhuma multidão de turistas profanava o silêncio; apenas o palácio e sua arrogância secular, guardião de tesouros que acreditava invulneráveis, enquanto a cidade acordava lenta e desatenta do outro lado dos portões.

O Louvre aguarda o homem cujas mãos pecaminosas irão despojar o magnífico museu de seus tesouros. O homem é audacioso, já falei, e ele irá colocar sua audácia e sua ousadia sob teste e ele conseguiu, de fato, seu intento ao realizar o roubo mais espetacular de sua época.

Ele roubou a Mona Lisa. Continuar lendo “A ópera-bufa do roubo ao Louvre”

Artigos da Semana 277

O dia hoje amanheceu chuvoso, pelo que agradeço. Além de não estar muito calor, tenho bons motivos para não sair de casa (se bem que o melhor motivo é que além de não ter nada de interessante fora de casa, ainda é cheio de… gente). Então, enquanto me deleito com um chocolate quente, sem sair da cama, vejamos o que foi publicado ao longo desta semana.

E não estou nem ai se rimou ou não.

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Gengibre, exorcismo e uma deidade viajante no seu corpo: o kit médico do Japão Medieval

Quando você vai ao médico hoje, existe um acordo tácito sobre o que esperar: exames de sangue, talvez uma receita de antibióticos, no máximo uma recomendação para cortar o glúten. O que definitivamente não está no cardápio é um exorcismo, uma consulta astrológica ou a informação de que você precisa adiar o tratamento porque uma deidade está passeando pela sua coxa esquerda neste dia; mas nem sempre foi assim. E para entender o quão diferente as coisas já foram, precisamos voltar mil anos no tempo e atravessar o planeta até chegar ao Japão do período Heian. Continuar lendo “Gengibre, exorcismo e uma deidade viajante no seu corpo: o kit médico do Japão Medieval”

O avião que foi ao Espaço sem querer e voltou para contar a história

Em 1983, Hollywood nos presenteou com Starflight One (Rota de Perigo, em português), um telefilme baseado no romance “Orbit” de Thomas H. Block. A premissa era deliciosamente absurda: um avião hipersônico comercial acidentalmente acaba na órbita terrestre durante seu voo inaugural. O filme era tão inverossímil que os críticos da época o chamaram de “Airport ‘85”, repleto de clichês de filmes de desastre e impossibilidades científicas hilariantes, como lançar o ônibus espacial Columbia três vezes em 24 horas, algo que demoraria semanas na vida real e usarem um caixão para o engenheiro passar de uma nave para outra (o caixão tem um buraco e ele tampa com o dedo, só para coroar a insânia).

A ficção pode parecer absurda às vezes. Mas do Além a voz de Tom Clancy ressoa dizendo “A ficção precisa fazer sentido, a Realidade, não”. 20 anos antes desse filme B ser filmado, algo igualmente absurdo – porém completamente real – já havia acontecido com o piloto Joe Walker em 19 de julho de 1963. Continuar lendo “O avião que foi ao Espaço sem querer e voltou para contar a história”

Elucubrações sobre o esperneio a respeito de uma escada

No vetusto ano de 2009, eu postei um artigo analisando, criticando e escrutinando a Escada de Loretto. Esta escada tem uma peculiaridade mística… ou é assim que a apresentam. Situada em um povoado localizado em Santa Fé, no Novo México esta escada fica uma capela recém-construída, e em 1878, as freiras perceberam que não havia como chegar ao coro, o pavimento superior. Elas passaram nove dias numa novena para São José. A história prossegue com um misterioso homem batendo à porta da capela no último dia. Disse que era carpinteiro e que poderia dar conta da tarefa. Ele construiu, sem ajuda de ninguém, e a escada que é considerada um prodígio de carpintaria: ninguém sabe como ela ficou de pé.

Terminado o trabalho, o homem que sumiu! E aqui começa o mito da Escada de Loretto, uma escada mística, mágica, incrível. Por algum motivo, as pessoas estão vindas às torrentes, 16 anos depois, desesperadas porque eu apontei que nada daquilo fazia sentido. Continuar lendo “Elucubrações sobre o esperneio a respeito de uma escada”

Artigos da Semana 276

Não fez tanto calor esta semana quanto semana passada e eu torcendo para Winter is Coming (não virá tão cedo). Aproveitei para dar uma caprichada em textos do Apoia.se, mesmo sacrificando um dia de postagem. Mas o que foi postado vale a pena. Sempre vale a pena.,

E se você não viu, taí a sua chance! Tem texto desde ferraris enterradas até esposas se transformando em cobras.

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O ouro líquido de Roma: o número 1 da Economia

A história humana está repleta de práticas que fazem você agradecer por ter nascido na era dos antibióticos e do saneamento básico. Mas poucas dessas práticas atingem o nível de “MAS HEIN?” que a relação dos romanos antigos com urina conseguiu alcançar. Estamos falando de uma civilização que construiu aquedutos magníficos, estradas que duraram milênios e um império que dominou o mundo conhecido e… bem, e que também fazia largo uso de urina para atividades do dia a dia.

Romanos achavam que o xixizão era recurso natural valioso demais para desperdiçar. Não estamos falando de um uso ocasional e discreto. Os romanos transformaram urina em indústria, cobraram impostos sobre ela e a incorporaram em praticamente todos os aspectos da vida cotidiana, da lavanderia à medicina. Bem-vindo ao mundo onde fazer xixi era literalmente seu dever cívico! Continuar lendo “O ouro líquido de Roma: o número 1 da Economia”

Quando o ketchup era branco, europeu e hoje chamariam de opressor

Se você acha que ketchup sempre foi aquela pasta vermelha açucarada que a gente despeja em batata frita ou na pizza, para horror do pessoal tosco que come comida ruim pois não sabe para que servem condimentos e temperos (devem achar um absurdo colocar sal na batata frita ou pimenta na feijoada, aqueles silvícolas).

A rigor, o catchup (ou ketchup) original nasceu há mais de mil e quinhentos anos na China como um molho fermentado de vísceras e entranhas de peixe. Sim, pois é. Os chinas obtinham o molho espremendo tripas de peixe numa jarra, deixando aquilo fermentar ao sol por até 100 dias no inverno, e chamando de tempero. Continuar lendo “Quando o ketchup era branco, europeu e hoje chamariam de opressor”